Thursday, June 14, 2018

DIZEM ALGUNS…

(desenho de Siza Vieira)




Dizem
alguns que tu
foste uma lenda arrancada

das páginas da história. Que a tua
palavra ardia
como uma tocha, às vezes
como uma lança cravada
na carne da ignomínia.
Eu diria
apenas que foste
a encarnação dum sonho, o rosto
humano da utopia.


Albano Martins

Wednesday, June 13, 2018

Homenagem a Alvaro Cunhal


ENTRE AS FLORES DE JUNHO

As tuas cinzas jazem num canteiro No último combate com a fatalIdade No derradeiro encontro das Quatro Estações Assim te semeaste nos Jardins da Terra Assim respondeste às bandeiras nos túmulos numa tarde de sol para todos nós Entre as flores de Junho

Álvaro

Saiu uma nuvem de adeus No crematório Entre as jacarandás Vestidas de roxo

Álvaro

Tu sabias que eras pó criaDor Tu sabias que eras breve mas jamais ausEnte

Álvaro

Não vale a pena dizer que não morreste Vale a pena dizer o que deve ser dito Que nos ensinaste a viVer e a morrer

Álvaro

Não repetirei os passos da tua vida Não recontarei os passos da tua morte Somente lembrarei que a História da Humanidade e a História de Portugal estiveram no teu cortejo e bem se vê que continuarão a precisar do teu nome Para escreVer o nome do Homem

Álvaro

Lámpara Marina em cada anoitecer Na melancolia recliNada nas janelas de Lisboa

Álvaro

Dir-te-ei Continuas presEnte no mundo Embora te tenhas ausentado em Junho

Álvaro

Nunca será em vão chOrar por ti Mas cantaremos todos os dias Até que amanhã seja já hoje 


César Príncipe

Monday, June 11, 2018

Homenagem a Vasco Gonçalves


É claro que soube

É claro que viveste e eu soube É claro que morreste e eu soube

Mas tanto me custou desPedir-me Mas tanto me impediu de te rever É claro que nem telefonei à Aida Pensei em redimir-me com uma carta sem pêsames Logo que a resPIRAção autorizasse os meus dedos a escreVer o teu nome É claro que continuas meu companheiro O da vida esperada O da morte inesperada Não te vou recorDar os tempos em que os sonhos eram ilegais e que tu e outros legalizaram Cumprindo o deVer das armas que raramente se usam para sonhar É claro que viveste e eu soube É claro que morreste e eu soube Estou em Agosto e quero dizer àqueles que te apeLidaram de louco Que realmente bem vistas as coisas Só um louco é justo Só um louco é herói Só um louco é poeta E tu Companheiro Cometeste a louCura de aMar o teu Povo Num tempo em que outros Às claras e em segredo Se punham ao serViço do eu e do medo

Recordamos a tua gravata aos ventos da Ibéria Os teus gestos de um Novo Estio na hora de aproFunDar o sonho ou vogar à superfície Depois de Setembro Depois de Março Depois do Passado É claro que viveste e eu soube É claro que morreste e eu soube É claro que exististe antes de nascer e que existirás depois de morrer Porque não és somente um nome a fixar na História mas um nome para transforMar a História Soubeste ser Português e ser Universal Soubeste ser General e ser Soldado Soubeste ser Engenheiro e ser Operário Assim Foste o Governante a quem chamámos Chamaremos Companheiro Porque tu foste propriedade e não proprietário de multidões Porque o teu sonho não foi anDar aos ombros das multidões Mas anDar com as multidões aos ombros Além disso Companheiro Foste um General com Biblioteca Por isso Poetas Escritores Pintores Cantores te dedicaram as elegias inaugurais

É claro que viveste e eu soube É claro que morreste e eu soube

Porque eu já sabia que eras o Vasco da Índia Que fora ignOrada em todas as partidas Eu sabia que declaraste ALMADA o Novo Promontório O das especiarias de cravos O das caraVelas sem escravos Foi então que os senhores de muitos séculos se ALVOroçaram com o Adamastor O Gonçalvismo Sim Senhor E claMARam por socorro aos restantes Senhores do Mundo Foi então que perceberam que se aproximava No meio de Camponeses e SolDados Artistas Professores Funcionários Operários e Marinheiros Cristãos e Ateus com fé no Homem A tempestade temida pelos Geógrafos desde o desenho dos primeiros mapas Temiam eles Ainda temem que o sol não inunde apenas as praias

E que à beira-mar irrompa um arco-íris

ProclAmando

Existe
Um Mês chAmado Abril

Existe
Um Homem chAmado Vasco

César Príncipe

Sunday, June 03, 2018

Nós




Guardo estes nós dentro do peito. Nós que foram laços, mas que fui atando cada vez mais. Para que nunca saíssem de mim. Para que ficassem para sempre.

Guardo estes nós dentro do peito. São nós que não desfaço, porque são o meu conforto em horas outras. Quando me perco nas noites. Quando me falta o nosso abraço. 

Guardo estes nós dentro do peito. Nós dos amores da saudade da luta da memória dos segredos. Porque são a minha vida. E por isso são cheios de tanto...