Thursday, August 30, 2012

Que...


Que o sonho vive em ti eu sei. Colhes flores de todas as cores com que fazes um leito onde o corpo descansa e faz o que tem de ser feito. Cobres-te com um manto de estrelas. E a estrela maior sorri-te.

Que as memórias te povoam as noites e os dias eu sei. Jamais poderás matá-las porque são a essência de ti a tua vida e também a tua luta.

Despertas pela madrugada com o cheiro a maresia. E o mar a teus pés sorri-te.

Que a tua pele te queima eu sei. Sangue fervendo de paixões e amores e canções que não cantas mas lanças ao vento que as devolve num abraço leve. Como leve é o pranto. Como breve é a vida. Como eterno é o teu abraço...

Tuesday, August 28, 2012

.....


Ainda te respiro. E esse é o problema. Mesmo quando olho as estrelas procurando uma mais brilhante não consigo ver nenhuma tão bonita como o teu sorriso. E esse é também o problema. Ainda te encontro tanto em mim...

Sunday, August 26, 2012

Música para um domingo





Tocando em Frente
Almir Sater

Ando devagar
Porque já tive pressa
E levo esse sorriso
Porque já chorei demais

Hoje me sinto mais forte,
Mais feliz, quem sabe
Só levo a certeza
De que muito pouco sei,
Ou nada sei

Conhecer as manhas
E as manhãs
O sabor das massas
E das maçãs

É preciso amor
Pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir

Penso que cumprir a vida
Seja simplesmente
Compreender a marcha
E ir tocando em frente

Como um velho boiadeiro
Levando a boiada
Eu vou tocando os dias
Pela longa estrada, eu vou
Estrada eu sou

Conhecer as manhas
E as manhãs
O sabor das massas
E das maçãs

É preciso amor
Pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir

Todo mundo ama um dia,
Todo mundo chora
Um dia a gente chega
E no outro vai embora

Cada um de nós compõe a sua história
Cada ser em si
Carrega o dom de ser capaz
E ser feliz

Conhecer as manhas
E as manhãs
O sabor das massas
E das maçãs

É preciso amor
Pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir

Ando devagar
Porque já tive pressa
E levo esse sorriso
Porque já chorei demais

Cada um de nós compõe a sua história
Cada ser em si
Carrega o dom de ser capaz
E ser feliz

Saturday, August 25, 2012

Pequeno poema


Klimt, Mãe e Filho

Quando eu nasci,
ficou tudo como estava.
Nem homens cortaram veias, nem o Sol escureceu, nem houve Estrelas a mais... Somente, esquecida das dores, a minha Mãe sorriu e agradeceu.
Quando eu nasci, não houve nada de novo senão eu.
As nuvens não se espantaram, não enlouqueceu ninguém...
P'ra que o dia fosse enorme, bastava toda a ternura que olhava nos olhos de minha Mãe...

(Sebastião da Gama)

Monday, August 20, 2012

Meu galope é em frente


Direis que não é poesia
e a
mim que importa?
Eu canto porque a voz nasce e tem de libertar-se.
E
grito porque respondo
às
lanças que me espetam
e aos
braços que me chamam,
E
porque, dia e noite, minhas mãos e meus olhos,
por estranhas telegrafias,
dos
cantos mais ignotos
e das
linhas perdidas
e dos
campos esquecidos
e dos
lagos remotos,
e dos
montes,
recebem longas
mensagens e comunicações:
para que grite e cante.
O meu grito e meu canto é a voz de milhões.
Por isso que me importa?
Eu canto e cantarei o que tiver a cantar
e
grito e gritarei o que tiver a gritar
e
falo e falarei o que tiver a falar.
Direis que não é poesia.
E a
mim que importa
se
eu estou aqui apenas para escancarar a porta
e
derrubar os muros?
E a
mim que importa
se
vós sois afinal o que hei-de ultrapassar
e
esmigalhar
em nome
de
todos os futuros?
Eu sigo e seguirei,
como um doido ou um anjo,
obstinado e heróico a caminho de nós
em palavras e acções
por todos os vendavais
e
temporais
e
multidões
nos cantos mais ignotos
e nas
linhas perdidas
e
nos campos esquecidos
e
nos lagos remotos
e
nos montes
-
por terra, mar e ar.
Direis que não é poesia
E a
mim que importa!
Convosco ou não, meu galope é em frente.
Pertenço a
outra raça, a outro mundo, a outra gente.
É andar, é andar!

Mário Dionísio

Sunday, August 19, 2012

Memória de Federico Garcia Lorca




Verde que te quiero verde, ¡ay!
verde que te quiero verde.
Verde que te quiero verde, ¡ay!
verde que te quiero verde.

Los toros se han revelado,
la impotencia llora y llama,
y desde un río de sangre
hay una voz que reclama, ¡ay!
hay una voz que reclama
la importancia de un amigo,
poeta de cien mil lunas,
garganta dura y hombruna,
gitano de profesión, ¡ay!
por quien hoy rompo yo la voz.

Verde que te quiero verde, ¡ay!
verde que te quiero verde.

Se te escapó la mañana
por detrás de la alcazaba,
caminando ya sin prisas,
amaestrando sonrisas, ¡ay!
amaestrando sonrisas;
y se tiñeron los campos
verdes de la primavera
cuando la nación entera
cabalgó sobre tu llanto ¡ay!
Tú poeta, y ellos tantos...

Verde que te quiero verde, ¡ay!
verde que te quiero verde.

Hoy el verso me reclama
una luz y una llamada,
un canto de cuerpo y alma
como el que el tuyo cantaba, ¡ay!
como el que el tuyo cantaba.

Y el pueblo llora la calma,
y canta porque se ahorca,
y hace tu muerte inmortal
cada vez que alguien te nombra
Federico García Lorca.


Patxi Andion
 

Saturday, August 18, 2012

Música para o fim-de-semana




Não é a primeira vez que coloco aqui esta cantiga. Não será a última...

Monday, August 13, 2012

Ainda não dissemos tudo



A serpente persegue a sombra da águia
até ao lugar onde é mais profunda a raiz da água.
Porque escondes o teu livro
quando folheias o coração?
Em que lugar amadurecem cachos de surpresa
durante a ausência dos teus dedos?
Esta manhã é soberba
de sonhos e de cães.
Espero por ti depois das horas de ternura
para mais ternura ainda.
Espero por ti depois do amor
para fazermos mais amor.
Façamos café, depois do fogo.
Temos, dos outros, as nossas mãos.
Herdámos a vida de mulheres e de homens antes de nós
e a outros homens e as outras mulheres não deixaremos
apenas o vento como herança.
O que vês na água?
Com quê construíste a tua casa?
Em que manhã fizeste perguntas ao teu filho?
A serpente continua perseguindo
a sombra da águia.
De quem é o objecto que deténs em tua mão?
Porque cresce a tristeza nos teus ombros?
Esse rio que passa à tua porta e chama por ti
é um rio de sangue
com um caudal de corpos inocentes.
As suas margens são agrestes mas a tua infelicidade
não deixa que lhes descubras os punhais.
Há em ti o mesmo rio.
Não poderás dar um passo, longe ou perto,
sem que firas a tua carne
ou magoes mais os ossos já antes magoados.
Tu tens as tuas próprias margens.
Por favor, destrói as tuas margens.
Acende uma fogueira para que dentro dos teus olhos
possas sentar-te comigo em redor do fogo.
A lua calou-se. Está morta.
Morreram com ela metade dos poetas
e a nova poesia será escrita pelos que sobreviveram.
Verás passar pela tua noite
os mais humildes, os mais sacrificados, aqueles que,
conhecendo o medo,  não aceitam as privações e a miséria.
Não poderás voltar-te para o lado e adormecer.
Não deves voltar-te para o lado e tentar esquecer.
Há quanto tempo não escutas a tua fala?
Que espécie de claridade adquiriste para as tuas janelas?
Hoje não é o último dia.
Corre agora a serpente
sobre a sombra da águia. Para lá da tua bebida
morrem povos com sede.
Há milhares de criaturas mortas
nos restos das tuas refeições.
Ajudas a assassinar rios, pássaros e muitos dos teus irmãos
com um simples encolher de ombros.
Constroem-se toneladas de bombas na tua indiferença.
Envenenam-se oceanos para teu conforto.
Por toda a parte se polui o ar de vales e montanhas
para fabricar a tua asfixia.
De onde retirarás mais diamantes? Da boca dos cadáveres?
Em que morte
deixarás apodrecer a tua vida?
A serpente desafia
a sombra da águia.
A nossa manhã continua soberba
de sonhos e de cães.
Façamos café, depois do fogo.
E conversemos. Ainda não
dissemos tudo.

Joaquim Pessoa

in "Inéditos" de "125 POEMAS,
Antologia poética",
Litexa Editora, 3ª ed.


Monday, August 06, 2012

ARTE DE NAVEGAR


Vê como o Verão
subitamente
se faz água no teu peito,

e a noite se faz barco,

e minha mão marinheiro.

Eugénio de Andrade

Wednesday, August 01, 2012

Sem título



primeiro foi a tua roupa interior,
depois levaste os vestidos,
as blusas, a escova de penteares os cabelos após o duche.
depois levaste o corpo que vestias e que despias,
os cabelos, os olhos, finalmente.
depois a casa ficou mais fria,
como um remoinho de coisa nenhuma,
onde tudo se esgota inexoravelmente para o vazio.
depois, mesmo depois de teres ido,
abandonou-me o cheiro que deixaste nos lençóis.

lentamente, vai-se a alma que aqui morava,
e definha a que me habita.
 
Miguel Tiago