Para te beber gota a gota. Nas noites.
Para te abraçar assim. Nos dias.
Nasci para morrer contigo. Hoje.
Esmago-me no beijo da tua boca. Aberta.
Estremeço-me e contigo morro. Agora.
Nasceremos outra vez. Sempre…
"QUANDO EU MORRER VOLTAREI PARA BUSCAR OS INSTANTES QUE NÃO VIVI JUNTO DO MAR" (Sophia de Mello Breyner Andresen)
Penetras-me todos os dias, sempre que te apetece. Deixas que eu me encha de ti, naturalmente. Namoras-me e saboreias-me da mesma forma e ao mesmo tempo que te namoro e te saboreio. As crianças a brincarem com a nossa espuma.
A corrente leva-me sempre para ti, e traz-te de volta. Mas é de noite que nos amamos melhor. Com as estrelas como manto. Às vezes a lua, cúmplice dos nossos beijos e abraços. Enquanto as crianças sonham com castelos de areia e sorriem.
Nas minhas margens costumam chapinhar os mais pequenos e deixo que os barquinhos se passeiem imaginando viagens que não fazem. Mas estes dias foram de tempestades e amores proibidos, e as margens que em mim deixaste são enormes. Cavaste um fosso entre mim e o que resta da praia, que continuas a lamber. As minhas margens são agora enormes. Como podem as crianças voltar a brincar no meu regaço?
Refaz-me, uma e outra vez, com a doçura com que sempre o fizeste. Preciso do teu abraço, forte. E das gargalhadas das crianças...
Demos as mãos com a ternura do amor primeiro. O nosso.
Pintámos esse amor com o vermelho da paixão. Vivido.
Das palavras que nos dissemos só uma ficou acordada. Falo da saudade
Todas as outras adormeceram no tempo no dia na hora que não escolhemos
Vejo os teus olhos que me sorriem e tu não me vês.
Dou-te um abraço apertado que tu não sentes.
Beijo-te o corpo sem te tocar e amo-te!
Mantenho o teu cheiro, que guardo com todos os sentidos.
Vives rente ao meu coração que ainda bate descompassado, por ti.
Agora sou eu que quero sair de dentro de mim.
Estilhaçar-me em mil pedaços.
… e não consigo…
As palavras não me chegam à boca nem às mãos não as consigo dizer nem escrever e no entanto estão todas cá dentro sinto-as num turbilhão no estômago acotovelam-se gritam umas com as outras mas recusam-se a sair As palavras que tenho para vos dar são doces e amargas são fortes e fracas são paz e guerra mas não saem continuam cá dentro ouço-as rir parece que brincam comigo ou decidiram esperar que me canse e as vomite mas não As palavras que quero falar são azuis e brancas e vermelhas e verdes têm todas as cores de todas as flores às vezes penso que as palavras que tenho cá dentro são flores mas não sou terra apenas as sinto e não são raízes de mim As palavras que vou libertando aos poucos voam-me e não as seguro porque são pássaros de asas azuis pedaços meus e voam tão alto asas feitas de algodão e maresia de espuma e areia de fogo e vento de ar e de água é isso as minhas palavras asas são feitas de água. Onde desaguas o teu rio. Onde eu me desfaço. No mar de todos os afectos.