Tuesday, December 10, 2024

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Andámos a distribuir cigarros pelos soldados.
De guarda aos quartéis, espingardas mansas assentes no chão.
E os cravos [tão presentes em nós, ainda].
E a gente... tanta.
Tu aqui, e tu, e tu, também. Afinal...
Os cartazes alinhavados por mãos apaixonadas gritando todas as palavras só conhecidas em letra clandestina.
Todos os abraços, todas as presenças até então atrás de grades, de fronteiras, de casas escondidas.
Todas as lágrimas choradas de alegrias, agora.
- Como cresci, irmão. Como embranqueceram entretanto os teus cabelos.
Esquecer a dor. Soltá-la. Vê-la transformada num imenso rio a caminho do amanhã.
Em cada rosto, em cada olhar, lia-se uma só palavra - Liberdade.
E nas vozes um grito forte que continua ainda hoje a comandar os nossos passos.
Mesmo quando silenciosos, mesmo quando nasce o desencanto.
Nunca mais!
Maria Eugénia Cunhal

Saturday, December 07, 2024

Fado Lezíria

Mar Ribatejo, maré cheia
O meu cavalo deslumbrou se
E galopando pela areia
Bebeu o mar salgado e doce.
É na lezíria que nos cheira
A maré viva nos esteiros
Água chorada a vida inteira
De homens que foram pioneiros.
Luz numa praça de aventura
Luzes no traje de um toureiro
Garcia Lorca que procura
Ver numa arena o seu tinteiro.
Mundo de passes e faenas
E de lugares de sombra e sol
Os dois sectores que há nos poemas
Vivos na prosa do Redol.
Tira o barrete põe o colete
De homem p'ra homem enfrenta o toiro
Ensina o verde ao teu ginete
Que o verde é esperança
Que o verde é oiro.
Tira o barrete põe o colete
Pega de caras o teu destino
Tira do verde todo o verdete
Homem inteiro, verde campino.

Ary dos Santos

Friday, December 06, 2024

Voto de pesar pela morte de Celeste dos Cravos aprovado por unanimidade

Apresentada pelo PCP, a iniciativa recordou a mulher que um dia «levantou-se para ir trabalhar num restaurante situado em Lisboa, na Rua Braancamp» e acabou por dar cor à Revolução. Após a votação todos, à excepção do Chega e CDS, bateram palmas de pé.


Celeste Caeiro, também conhecida carinhosamente por Celeste dos Cravos, faleceu no passado dia 15 de Novembro, aos 91 anos. Nascida em Lisboa a 2 de Maio de 1933, «oriunda de uma família humilde, e viveu grande parte da sua vida em Lisboa», Celeste ficou na história por ter sido a pessoa que começou a distribuir cravos, batizando a Revolução e tornando-se numa cara de Abril.

«Enfrentou uma vida de dificuldades com perseverança. Mulher trabalhadora, de fortes convicções, e militante comunista até ao fim da sua vida, a sua generosidade e afabilidade ficará na memória de todos os que com ela conviveram», podia ler-se na iniciativa apresentada pelo PCP. 

O voto de pesar dos comunistas descreveu também o dia em que Celeste ficou na história, relembrando que o restaurante onde trabalhava fazia um ano a 25 de Abril de 1974 e por essa razão comprou flores para oferecer aos clientes. Com o alvoroço e incerteza, o restaurante acabou por não abrir nesse dia e os cravos foram distribuídos pelas trabalhadoras. Celeste não foi para casa, juntou-se aos populares no Chiado e tendo sido informada por um dos soldados de que estava em curso uma revolução, ofereceu-lhe um cravo que o militar colocou no cano da espingarda. 

Aprovado por unanimidade, de seguida as bancadas bateram palmas de pé aos familiares presentes nas galerias, à exceção do Chega e CDS-PP, cujos deputados permaneceram sentados. 

Sobre o Centenário do Nascimento de Mário Soares

https://youtu.be/zVzOXhpIWKw?si=ThH3FZamPB26rTIa