Tuesday, November 05, 2024

Auditoras externas – ludibriadas por Salgado ou cúmplices do BES?


Durante os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão do BES e do Grupo Espírito Santo puderam apurar-se inúmeras práticas que consolidaram todas as teses do Partido Comunista Português sobre a incompatibilidade da banca privada e o interesse público, todas as teses sobre a farsa da regulação e da supervisão e todas as teses sobre a subordinação do poder político ao poder económico. Além disso, ficou ainda provado o entrelaçamento profundo entre a corrupção, as privatizações e a política de direita.
O julgamento do caso BES, que se inicia dez anos após o início dos trabalhos da Comissão de Inquérito, vem relembrar várias das questões levantadas ao longo dos trabalhos dessa comissão e algumas merecem uma reflexão também política, para lá da judicial.
Foi divulgado na comunicação social desta semana que uma das técnicas da auditora externa KPMG testemunhou sobre o caso BES apontando um largo conjunto de questões sobre os métodos da instituição bancária, nomeadamente sobre a falta de acesso a informação, sobre emissões de obrigações sem paralelo na banca, sobre recompra de obrigações, sobre o financiamento da componente não financeira do grupo monopolista – o GES –, sobre a falta de eficácia e «deficiências» no controlo interno do banco.
A técnica da KPMG – Inês Viegas – deixou claro que havia dificuldades em obter informações sobre todas as actividades do grupo e que comunicava todos esses problemas à sua chefia. Este ensaio, que constitui uma espécie de «fomos apanhados de surpresa» é uma confissão da cumplicidade das auditoras que não deixa ilesa a anterior auditora – a PWC. A PWC colocara questões já em 2001, denunciando a exposição extrema e de elevado risco do BES ao GES, num relatório que nunca viu a luz do dia e que aparentemente terá levado ao fim da contratação da PWC como auditora externa do BES, apesar de ter permanecido como auditora de algumas empresas do GES.
A forma como a KPMG tentou sempre ao longo da história do colapso do BES desresponsabilizar-se pela situação a que o banco chegou seria cómica, não fossem os quase 10 mil milhões de euros que a actuação combinada do conjunto de instituições (auditoras, governo, Banco de Portugal, BES) já fez aos portugueses desembolsar.
Para um breve, mas útil, exercício de memória, relembremos algumas conclusões a que o inquérito parlamentar nos permitiu chegar em 2015:
1. O Banco de Portugal tinha uma funcionária técnica em supervisão directa no BES, no interior da instituição, que nunca se apercebeu de absolutamente nada, nem tomou ou accionou qualquer medida preventiva perante a exposição desmedida do BES ao GES.
2. A KPMG Portugal era dirigida por Sikander Sattar, senior partner, e este tinha relativo conhecimento do dossier BES mas nunca se apercebeu – ao longo de vários anos de auditoria – dos problemas das contas do BES e do GES, sendo que nunca colocara ênfases ou reservas nas contas do banco. Sikander Sattar foi convocado em duas posições para o inquérito parlamentar: como presidente da KPMG Portugal e como presidente da KPMG Angola. O ridículo começa a tornar-se óbvio.
3. A KPMG Portugal não sabia nada sobre a exposição do BES ao BESA (BES Angola).
4. A KPMG Angola auditava o BESA e tinha perfeita noção dos valores transferidos (com autorização do Banco de Portugal) do BES para o BESA.
5. As contas de 2001 foram auditadas pela PWC, que levantou várias questões numa versão preliminar do relatório de auditoria, curiosamente, nunca tornado público. A versão final das contas surge expurgada dessas questões. Esse documento foi ocultado à comissão de inquérito até ter surgido na comunicação social, pese embora o PCP o tenha mencionado inúmeras vezes nas sessões de inquérito.
6. A PWC não transmitiu à KPMG quaisquer reservas sobre o comportamento do BES.
7. O Banco de Portugal limitava-se a aceitar os relatórios de auditoria das auditoras, sem ter qualquer forma para proceder à sua verificação.
Estes factos, que são também possíveis conclusões dos trabalhos da comissão de inquérito, demonstram o grau de envolvimento entre auditores externos e os auditados, bem como a incapacidade de fiscalização real por parte da autoridade bancária, no caso, o Banco de Portugal. A situação bizarra de o presidente da KPMG Portugal ser exactamente a mesma pessoa que o presidente da KPMG Portugal e o presidente da KPMG Angola saber de coisas que não podia, por sigilo, comunicar ao presidente da KPMG Portugal é só um ingrediente extra num enredo já de si escandaloso.
A existência de uma versão preliminar de um relatório de auditoria de 2001, da PWC, em que a exposição do BES ao GES já é referida como preocupante, bem como são expostas algumas outras práticas do BES e da sua administração, mostra bem que os problemas são conhecidos e existem pelo menos desde o início da década. O facto de o PCP ter mencionado vezes sem conta esse relatório em plenas sessões da comissão de inquérito e o facto de isso nunca ter sido sequer mencionado na comunicação social é também apenas mais um elemento deste processo, elemento que ilustra a forma como foi silenciado o trabalho do PCP, em prejuízo da qualidade do inquérito. É relevante relembrar que a comunicação social presente na sala aproveitava comummente o tempo de intervenção do PCP para fazer as suas pausas e retirar-se do espaço.
A existência desse relatório anunciada pelo PCP desde o início das audições parlamentares, ignorada pela comunicação social e negada pelos responsáveis do BES e pela própria KPMG até ao dia em que a RTP anuncia ser detentora de uma cópia, prova bem que os testemunhos de Inês Viegas só podem revelar três coisas, que podem ser simultâneas: a inexistência da comunicação entre auditoras no momento da passagem de pasta, prevista na lei; a cumplicidade da auditora externa com as práticas do BES; a incapacidade de obter informação correcta e de articular o trabalho da auditoria externa com o controlo interno da instituição.
Em qualquer dos casos, todas as possibilidades apontam para a evidência de que a arquitectura da supervisão bancária não é mais do que uma grande farsa, um grande fingimento com vista à tranquilização do público e dos depositantes. A KPMG, tal como a PWC, não falharam na auditoria externa, não se enganaram, não foram alvos de ocultação de informações relevantes (e se fossem, a denúncia a posteriori de pouco adianta), foram antes os cúmplices da administração do BES e do GES, contribuindo activamente para ocultar falsificações e contas marteladas, permitindo um desequilíbrio nas contas do Grupo que chegou a atingir 18 mil milhões de euros, 10 dos quais praticamente assumidos pelos trabalhadores portugueses através dos empréstimos ao fundo de resolução e das garantias dadas a activos tóxicos no balanço do Novo Banco aquando da sua entrega à Lone Star.
A promiscuidade entre governo e banca só é suplantada pela promiscuidade entre banca e auditoras externas: veja-se a naturalidade com que quadros das auditoras passam a integrar quadros da banca, quase como se isso constituísse o passo lógico e expectável da progressão na carreira. É quase como se a auditoria externa fosse o reservatório de recrutamento da banca para funções que visam, no interior do banco, assegurar a ocultação de práticas, martelar contas, contribuir para a aparente legalidade e estabilidade das instituições. Os auditores bem sucedidos na carreira passam rapidamente a consiglieris.
Inês Viegas pode agora em tribunal tentar disfarçar o papel que a KPMG teve ao longo do percurso do BES e isso será parte da história do processo. Mas o que é mesmo preocupante é não ter sido nada feito quanto à promiscuidade entre auditoras e banca e quanto à capacidade real do Banco de Portugal realizar as suas próprias auditorias, sem recurso às auditoras externas que trabalham para a banca. E tudo isso continua por resolver porque, desde 2015, a Assembleia da República rejeita sistematicamente as propostas do PCP em que se introduz um período de nojo de 4 anos para transferências de quadros das auditoras para a banca, por exemplo, ou em que se determina algo tão simples como a autonomia e independência da supervisão bancária, assegurando a existência de uma equipa de auditoria própria do Banco de Portugal.
A intervenção da KPMG no caso BES é também mais um elemento que comprova o papel das chamadas «quatro grandes» (Deloitte, E&Y, PWC e KPMG) como biombos que nos ocultam as práticas da banca privada, num contexto em que existe elevada rotatividade de quadros e interesses entre auditado e auditor, papel esse a que urge colocar um fim através de medidas de controlo público da banca.
O «currículo», ou talvez melhor cadastro, daquelas quatro multinacionais especializadas em auditorias, consultorias, e classificação dos «ratings» de Estados e empresas/grupos económicos, em particular na área financeira, evidencia a total fraude e mistificação que é a entrega ao capital privado, sujeito à lógica inexorável da maximização dos lucros, da monitorização e fiscalização da legalidade jurídica e cumprimento de normas administrativas e técnicas dos negócios do capitalismo internacional e nacional. A sua manutenção nessas funções de juízes da violação do ordenamento e regulamentação legais e constitucionais da actividade económica empresarial privada significa a total cumplicidade dos Estados das grandes potências. E torna irrecusável, perante os exemplos que se sucederam nas últimas décadas em Portugal e no mundo, a exigência de que tais competências e funções sejam realizados por entidades públicas, sujeitas ao escrutínio democrático dos cidadãos através dos órgãos legislativo, executivo e judicial de Estados soberanos. Eliminam-se assim radicalmente os riscos de corrupção, nepotismo e fraude? Não. Mas permitem que esses fenómenos sejam postos a nu, com outra prontidão e celeridade, avaliados e julgados através das instituições estatais sujeitas elas próprias à normatividade legal e constitucional do Estado de direito, mesmo no quadro, complexo e contraditório, dos interesses de classe que comandam o Estado capitalista.

Miguel Tiago
AbrilAbril, 5.11.2024

Monday, November 04, 2024

POEMA QUINQUAGÉSIMO

 
Tanto é o amor de que a boca me alimenta
que eu amo as sílabas inchadas de ternura,
rebentos sanguíneos de uma fala breve e inquiridora
que quer saber de tudo, o poema, o livro, a noite e até
do fogo dentro das crianças, dos archotes que me guiam
pelas grutas do pensamento e pelas dunas claras
do teu corpo em repouso.
Nelas as minhas mãos aguardam o amanhecer
quando é mais doloroso chamar-te mulher ou mãe
ou fêmea. Ou roseira.
Na minha insónia a noite não é mais do que terra
sedenta e suplicante. A que, de bruços me pede amor
e me oferece amor, de rosto magoado pela paixão antiga
de uma vida cintilante mas cruel. Amo-te, amo-me
até aos ossos. E por este ofício de cantar-te eu daria
a minha vida, para encher, embriagado, a tua vida
de versos, de uma luz feliz.
Imagino-te tremendo nos antigos caminhos
enquanto a minha idade mergulha no mais fundo
das coisas que um dia me dirás.
Hoje, nada existe sem ti, sem a lucidez do dia,
tudo és tu, tudo é esta vontade de pertencer-te assim
como quem se entrega e se consome nesse fogo árduo
que os meus dedos acendem e a tua carne alimenta
quando a dor são palavras, nada mais que palavras,
e as palavras se imolam devagar.
Com uma fome ruiva, roubas da minha boca
os pães ainda quentes para dar aos versos
e a água prenhe e límpida para dar aos beijos.

Joaquim Pessoa

Friday, October 25, 2024

BES/GES: Quando o accionista assalta o banco, o Banco de Portugal guarda a porta e o Estado paga

 
Quando o PCP propôs, em 2014, a constituição da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à gestão do Banco Espírito Santo e do Grupo Espírito Santo, com vista ao esclarecimento das condições em que foi aplicada a medida da resolução ao BES, e da gestão do banco e do grupo que conduziram à ruptura, fê-lo com a convicção de que constituiria uma oportunidade política relevante para conhecer em detalhe o modelo de governação dos monopólios e da sua relação com o poder político. A vida veio a dar-nos razão. 

O caso BES/GES reforça a necessidade do controlo público do sistema financeiro

A intervenção do Partido nesta CPI foi determinante para denunciar as práticas do sistema financeiro e dos grupos monopolistas, o que aliás pode ser consultado no livro das Edições Avante! O dossier BES/GES, um retrato do capitalismo monopolista em Portugal, material de indispensável consulta quando agora assistimos ao arranque do julgamento de alguns dos seus responsáveis, dez anos após o colapso da instituição financeira. 
O caso da banca, em que ao BES se juntam os processos do BPN, BPP, BANIF e outros, mostram como estão entrelaçadas as privatizações, a corrupção, o poder dos grupos económico e o poder político, a política de direita. 
As práticas que levaram o BES ao seu colapso são internas e externas: o banco financiava as opções de todo o império Espírito Santo, o Banco de Portugal (BdP) fingia regular e supervisionar e os governos enlaçavam-se com o grupo. 
O Grupo e o Banco construíram uma miríade de off-shores, para todo o tipo de pagamentos a grandes accionistas. Recorde-se o exemplo do recurso ao BES Angola para desviar mais de 3 mil milhões de euros para financiar negócios e propriedades que nunca existiram. As grandes auditoras externas ocultavam – pelo menos desde 2001 – a situação de exposição grave que o banco tinha ao GES e tudo isso aconteceu e acontece no “cumprimento da lei”: é a lei que permite as transferências para off-shores; é a lei que dita que o BdP não tem auditoria própria e que os bancos são auditados por empresas  privadas; é a lei que permite que lucros gerados no País não paguem cá imposto. 
E foram as opções políticas que autorizaram o compromisso de milhares de milhões de euros com a resolução do banco e que determinaram que não seria nacionalizada a componente não financeira do Grupo, impedindo que se colmatassem as perdas públicas com o património do GES. E foi o governo PSD/CDS que determinou que o Estado pagaria a factura da corrupção dos grandes accionistas do BES que distribuíam créditos entre si, através do Fundo de Resolução. 
É importante frisar que hoje, como em 2014, ressurgem as ilusões sobre a natureza do fundo de resolução, seguindo Maria Luís Albuquerque, Passos e Portas. Hoje é claro para todos (incluindo para o Tribunal de Contas) que o FdR é uma entidade pública, financiada por dinheiro público. A ideia de que o FdR ressarcirá o Estado pelos empréstimos é falsa: em primeiro lugar, porque o dinheiro que alimenta o fundo é público, resultando de um imposto; em segundo lugar, porque nunca ultrapassou os 225 milhões de euros anuais (cobrados em 2023), o que pode significar que serão necessárias mais de quatro décadas para que o dinheiro seja totalmente devolvido. 
Este é o resultado das opções de PS, PSD e CDS e quanto ao regulador, supervisor e as grandes empresas de auditoria, estes não são polícias do sistema financeiro, antes os condutores do carro de fuga que, cúmplices, aguardam à porta disfarçado e tranquilizando os transeuntes. 
A realidade aí está a demonstrar que PS, PSD e seus sucedâneos pretendem continuar a farsa e a ocultação. As privatizações de que somos contemporâneos demonstram isso mesmo: esse compromisso dos governos com a grande burguesia nacional e transnacional ultrapassa qualquer medida de mero bom-senso e acautelamento do interesse público. 
Aqui chegados, o julgamento dos arguidos do caso BES não pode reduzir-se a uma espécie de expiação da culpa de um grupo circunscrito de malfeitores, antes tem de se constituir como um momento que ilustra as práticas e resultados das privatizações, da gestão privada da banca da farsa da supervisão, da subordinação do poder político ao poder económico, reafirmando a necessidade do controlo público do sistema financeiro.

Miguel Tiago
(Avante! 24.10.2024)     

Wednesday, October 23, 2024

Como é que se esquece alguém que se ama

Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa - como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está?
As pessoas têm de morrer; os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar Sim, mas como se faz? Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguém antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso aceitar, primeiro, aceitar. 

É preciso aceitar esta mágoa esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados se tivessem apenas o peso que têm em si, isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução. 

Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padece. Muitas vezes só existe a agulha. 

Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado. 

O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar. 

Miguel Esteves Cardoso, 
in 'Último Volume'

Tuesday, October 22, 2024

Das minhas memórias

 
Neste mesmo mês de Outubro, há 25 anos, fui pela primeira vez trabalhar nas autárquicas do distrito da Guarda. Aquele trabalho chato, mas muito gratificante, que é o de fazer listas com as candidaturas a 14 concelhos e 242 freguesias.
Hoje telefonei a uma Camarada (que quando sabia que eu ia ficar a trabalhar noite dentro, em todos os anos que lá trabalhei, me levava ao final da tarde pasteis de bacalhau) porque o filho fazia anos e queria dar-lhe os parabéns.
Acabei por falar com o aniversariante, que faz hoje 35 anos!!!! E não é que o jovem se mete comigo? Disse-me, a determinada altura da conversa, "pois é, quando eu te fui ajudar a primeira vez e te mostrei o trabalho disseste-me 'quem se mete a trabalhar com putos...', é que eu tinha agrafado as listas todas ao contrário..."
Rimos. O miúdo tinha 9 anos e queria ajudar. Agrafar papel não custa nada. Não sei que voltas ele deu às listas, depois foi só desagrafar e voltar a agrafar como a lei exige.
Ontem tinham-me perguntado o que me ligava à Guarda.
Para além de tudo o resto, é também esta cena, e outras, mais tarde, com 'camaradinhas' que hoje têm 18 ou 15 anos, e que também sempre queriam ajudar.
Está prometido, Daniel, um dia destes os km fazem-se pela A23.

Sunday, October 20, 2024

*

 
Podem as palavras um dia renascer? Pode o vento trazer de novo a ternura?
Pode a borboleta deixar ovos que implodem com o tempo e no final de todo o processo surgir a borboleta de asas azuis que se confunde com o céu?
Podes tu ainda voar no calor do meu abraço?

Thursday, October 17, 2024

Não posso adiar o amor



Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas

Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio

Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora intensa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração

António Ramos Rosa
(17.10.1924-23.9.2013)

Tuesday, October 15, 2024

Os olhos do poeta


O poeta tem olhos de água para reflectirem todas as cores do mundo,
e as formas e as proporções exactas, mesmo das coisas que os sábios desconhecem.
Em seu olhar estão as distâncias sem mistério que há entre as estrelas,
e estão as estrelas luzindo na penumbra dos bairros da miséria,
com as silhuetas escuras dos meninos vadios esguedelhados ao vento.
Em seu olhar estão as neves eternas dos Himalaias vencidos
e as rugas maceradas das mães que perderam os filhos na luta entre as pátrias
e o movimento ululante das cidades marítimas onde se falam todas as línguas da terra
e o gesto desolado dos homens que voltam ao lar com as mãos vazias e calejadas
e a luz do deserto incandescente e trémula, e os gestos dos polos, brancos, brancos,
e a sombra das pálpebras sobre o rosto das noivas que não noivaram
e os tesouros dos oceanos desvendados maravilhando com contos-de-fada à hora da infância
e os trapos negros das mulheres dos pescadores esvoaçando como bandeiras aflitas
e correndo pela costa de mãos jogadas pró mar amaldiçoando a tempestade:
- todas as cores, todas as formas do mundo se agitam e gritam nos olhos do poeta.
Do seu olhar, que é um farol erguido no alto de um promontório,
sai uma estrela voando nas trevas
tocando de esperança o coração dos homens de todas as latitudes.
E os dias claros, inundados de vida, perdem o brilho nos olhos do poeta
que escreve poemas de revolta com tinta de sol
na noite de angústia que pesa no mundo.

Manuel da Fonseca, “Rosa dos Ventos”

Sunday, October 06, 2024

Abandono (Fado Peniche)


Por teu livre pensamento
Foram-te longe encerrar.
Tão longe que o meu lamento
Não te consegue alcançar
E apenas ouves o vento
E apenas ouves o mar.

Levaram-te a meio da noite:
A treva tudo cobria.
Foi de noite, numa noite
De todas a mais sombria.
Foi de noite, foi de noite,
E nunca mais se fez dia.

Ai dessa noite o veneno
Persiste em me envenenar.
Oiço apenas o silêncio
Que ficou no teu lugar.
Ao menos ouves o vento!
Ao menos ouves o mar!

David Mourão-Ferreira

Wednesday, October 02, 2024

Dia 342.


Abraça-me. Quero ouvir o vento que vem da tua pele
e ver o sol nascer do intenso calor dos nossos corpos.
Quando me perfumo assim, em ti, nada existe a não ser
este relâmpago feliz, esta maçã azul que foi colhida
na palidez de todos os caminhos, e que ambos mordemos
para provar o sabor que tem a carne incandescente das estrelas.
Abraça-me. Veste o meu corpo de ti, para que em ti
eu possa buscar o sentido dos sentidos, o sentido da vida.
Procura-me com os teus antigos braços de criança
para desamarrar em mim a eternidade, essa soma formidável
de todos os momentos livres que a um e a outro pertenceram.
Abraça-me. Quero morrer de ti em mim, espantado de amor.
Dá-me a beber, antes, a água dos teus beijos,
para que possa levá-la comigo e oferecê-la aos astros
pequeninos. Só essa água fará reconhecer
o mais profundo, o mais intenso amor do universo,
e eu quero que dele fiquem a saber
até as estrelas mais antigas e brilhantes.
Abraça-me. Uma vez só. Uma vez mais.
Uma vez que nem sei se tu existes.

Saturday, September 28, 2024

Não me chames, eu vou já...

 "Joaquim Pessoa

Belíssimo poema, Maria! Tem a suavidade da pele e todas as tonalidades do amor. Um erotismo doce e generoso de que prefere dar, antes de receber. Parabéns por tanta qualidade."
Monday, 27 September 2010 at 02:47

Queria ter palavras para ti, mas não tenho. Não hoje.

Sentes o meu cheiro? Respiro-te por cada poro da minha pele, que tu vestiste. Eu sou duas peles, a minha e a tua. E o tempo corre e a tua pele ainda está em mim. Fica. És só meu porque te engoli, e agora dormes em mim e canto-te todas as noites canções de ninar. Até que adormeces abraçado a mim. Cá dentro.

Às vezes passeamos à beira mar e ris com as ondas que te refrescam os pés que só eu vejo. Apanhas conchas e fazes-me um colar de amor que nos une ainda mais. Como se este mais fosse possível, porque já é tudo. Viverás enquanto eu viver, porque o amor só acaba quando eu deixar de existir... e da saudade que te tenho não sei a medida...

Não me chames, eu vou já...

Friday, September 27, 2024

O ÚNICO HABITANTE


Conhecer-te
foi como chegar a uma ilha
com um único habitante: Tu.
Joaquim Pessoa

Monday, September 23, 2024

Peço silêncio

 
Agora deixem-me tranquilo.
Agora acostumem-se sem mim.
Eu vou fechar os olhos
E só quero cinco coisas,
Cinco raízes preferidas.
Uma é o amor sem fim.
A segunda é ver o Outono.
Não posso ser sem que as folhas
Voem e voltem à terra.
A terceira é o grave Inverno,
A chuva que amei, a carícia
Do fogo no frio silvestre.
Em quarto lugar o Verão
Redondo como uma melancia.
A quinta coisa são teus olhos,
Matilde minha, bem amada,
Não quero dormir sem teus olhos,
Não quero ser sem que me olhes:
Eu troco a Primavera
Pra que tu me fiques olhando.
Amigos, isso é tudo o que quero.
É quase nada e quase tudo.
Agora, se querem, que se vão.
Vivi tanto que um dia
Terão de esquecer-me com força,
Apagando-me do quadro negro:
Meu coração foi interminável.
Mas porque peço silêncio
Não creiam que vou morrer:
Pois é exactamente o contrário:
Acontece que vou viver.
Acontece que sou e que sigo.
Não será, pois, senão que dentro
De mim crescerão cereais,
Primeiro os grãos que rompem
A terra para ver a luz,
Porém a mãe terra é escura:
E dentro de mim sou escuro:
Sou como um poço em cujas águas
A noite deixa suas estrelas
E segue só pelo campo.
Trata-se de que tanto vivi
Que quero viver outro tanto.
Nunca me senti tão sonoro,
Nunca tive tantos beijos.
Agora, como sempre, é cedo.
Voa a luz com suas abelhas.
Deixem-me só com o dia.
Peço permissão para nascer.
Pablo Neruda

Wednesday, September 11, 2024

Requiem por Salvador Allende


Foi de súbito no outono juro solenemente que o foi
mas as árvores fora tinham de novo folhas recentes
primavera no chile primavera no mundo
Sinto-me vivo habito muito de pé numa casa
leio vagarosamente os jornais sei devagar que os leio
enfrento meu velho borges o muito meu destino sul-americano
Acabara um poema enchia o peito de ar junto da água
sentia-me importante conquistara palavras negação do tempo
o mar era mais meu sob a minha voz ali solta na praia
talvez voz metafísica decerto voz de um privilegiado
ombro a ombro com gente analfabeta uma gente sensível e leal
mas que não pode ler e vive muito menos por o não saber
embora saiba olhar o mar sem o saber interpretar
acabara um poema enchia o peito de ar junto da água
quando o irmão miguei veio pequeninamente pela areia
e convulsivamente me falou da situação no chile
veio pela praia e punha nas palavras mãos de solidão
mãos conviventes com outras palavras mãos que palavra a palavra
erguem um poema no silêncio só circundante
Allende tinha uns óculos os óculos tinham-no
com eles via a vida com eles via os homens via homens
via problemas de homens e as coisas que via eram coisas de homens
hoje apenas uns óculos sem nenhum olhar por detrás
Nos finais de setembro nos princípios de novembro
tu meu amigo que não posso nomear sem te denunciar
dar-me-ás talvez notícias tuas notícias meramente pessoais
já que projectos sociais projectos cívicos profissionais
ficariam decerto nas policiais desertas mãos dos generais
mãos que mataram mãos que assaltaram a casa de neruda
mãos limpas já do sangue despojadas já das alianças
que caridosamente deram que assim conseguiram
solucionar os prementes problemas do país
Ouvi falar também desse cargueiro playa larga
praia comprida mas praia deserta e não só na palavra
pois quanta praia tinha hoje só tem o sangue dos milhares das pessoas fuziladas
A onze de setembro nesta praia portuguesa só uns passos pela areia
algum poema terminado alienado algum termo conquistado
tão inefável como por exemplo o de tancazo
atribuído ao golpe orientado por pablo rodriguez
homem que vai modelando palavras ao ritmo martelado pelo ódio
na tentativa vã de destruir frases hoje históricas
do grande cavalheiro que decerto foi allende
e já antes de o dizer com a vida dizia que por exemplo
mais vale morrer de pé do que viver ajoelhado ou então
se as direitas me ajudam a ganhar ganharão as direitas
País amável calorosa entrada em Santiago
e ver-me em frente desse homem sozinho relutante em recorrer às armas
e que depois de o ter visto e o ter ouvido
ao homem que for homem poderei chamar-lhe
seja qual for o nome salvador allende
Que nestas minhas minerais palavras de poeta
vibre um pouco o vigor da tua voz
bafejando de paz primeiro o bom povo do chile
depois o povo bom de todo o inundo
Que a ignomínia da história não demore em cobrir com o seu manto
os que têm a força mas não têm a razão
pois o nazi-fascismo não ganhou nem nunca ganhará
Mando-te uma ave preta rente à leve ondulação do mar
tu mandas-me no mar a ave branca do teu rosto
vento que vem do mar vento que vem do chile
Aqui neste dia de súbito cinzento
somente povoado pelo meu sofrimento
e pelo pensamento desse sofrimento
voo também vou também eu nesse lenço
que retiro do bolso aqui à beira-mar
e o meu lenço ao vento é uma ave avesíssima uma ave de paz
uma ave avezada a cada uma das derrotas existentes no mar
somente agora destruída trespassada pela bala que leva uma vida
ave que ao entoar seu canto profundíssimo afinal apenas diz
muito obrigada salvador allende
obrigada por essa tua vida de cabeça erguida
só agora tombada trespassada pela bala que leva uma vida
mas não pode levar de vencida a obra por allende começada
selada por essa promessa de lutar até ao fim até à hora de morrer
nesse importante posto onde te investiram a lei e o povo
Foi no ano de mil novecentos e setenta
ano em que eu fiquei a apodrecer no meu país
que uma coligação do tipo frente popular tomou
pela via legal conta do poder no chile
legalidade sempre respeitada por ti allende
mas por fim desrespeitada pelos militares pelas direitas pela
cristã democracia partido bem pouco cristão e pouco democrático
Falavas tu dizias a verdade
falavas com palavras de verdade
uma bala na boca nessa boca donde ainda pouco antes
saíam as palavras na verdade belas como balas
salvador allende guerrilheiro sem metralhadora e sem boina
de casaco e gravata para essas guerrilhas no parlamento
guerrilhas todas elas tão contrárias à guerra quão favoráveis à paz
essa palavra alada como ave ave não só de georges braque
mas de nós todos aves verticais aves a última estação
árvores desfolhadas num definitivo inverno
allende do cansaço dos problemas da preocupação constante em jogares limpo
com quem em vez de mãos utensílio de paz vinha com bombas em lugar das mãos
allende já há muito tempo sem uns olhos para olhares o mar
e sem poderes olhar as pedras preciosas de que fala
pablo neruda teu e meu poeta teu íntimo amigo
em las piedras dei cielo esse livro puríssimo
e são pedras do céu mas mais do que céu pedras da terra
Sol que te pões e nascerás no chile
leva-me a um país que em criança conhecíamos apenas
dos sacos de serapilheira com o nome impresso de um nitrato
e não por dar o nome a uma pequena mas confusa praça de lisboa
nem por sair nas páginas diárias dos jornais
Do chile chegou-me não há muito a amizade do hernán
que em madrid conheci e não responde há muito às minhas cartas
e a de mais chilenos de olhos vagamente tristes sérios quase portugueses
e desse país mais comprido do globo veio-me também
o lápis-lazúli pedra não já de esperança pedra de amizade
Os camiões há muito já que não sulcavam as estradas do país
estradas bafejadas pela aragem enviada pelo mar por esse
oceano pacífico de um país ainda há pouco bem pacífico
O washington post falava já do golpe dias antes do golpe
ninguém falava delas mas elas encontravam-se ali mesmo
as autoridades militares as autoridades militares as autoridades americanas
vestiam mesmo as fardas do exército chileno
esses americanos gente do dinheiro e do veneno
de um veneno talvez chamado dinheiro
que terá pago em parte as modificações dos foguetes do tipo poseidon
montados já a bordo dos divinos submarinos nucleares americanos
assunto de política estrangeira americana
Hernán urrutia meu amigo austral
que em barajas vi olhar voltar
para mim a cabeça pela última vez
marcelo coddo professor em concepción
com quem que bem me lembro conversei sobre o poeta cardenal
e sobre a jovem poesia nicaraguense
e tantos outros que nem mesmo me terão deixado o nome
mas me deixaram alguma palavra a música da fala um certo sorriso
um certo olhar visível por detrás de uns óculos
talvez hoje quebrados por quem não considera
talvez suficiente o quebrar da vida na haste da vida
embora porventura tenha visto aquela sequência de fellini
e desconhece que afinal a vida reproduz a arte
Escreve este poema no jornal com as notícias frescas
após ter evitado ver as caras de triunfo desses locutores luzidios da televisão
e mesmo ter ouvido até a voz desse pedro moutinho
a voz das afluências ao nosso principal estádio o da cova da iria
e dos cortejos presidenciais o dessas tão espontâneas manifestações
voz afinal da cia e da itt e dos demais tentáculos
do imperialismo norte-americano
maneira americana de se estar no mundo
de estar no mundo arrebatando o pão dos homens do terceiro mundo
terceiro mundo ou melhor último mundo
que pagarão agora o preço da cabeça dos trabalhadores chilenos
que marcham mas decerto em vão na direcção
do centro de santiago onde vingara
a rebelião dos marinheiros vindos de valparaiso
cabeça dos imensos deserdados deste mundo
Sabíamos decerto um pouco em que consistia
essa via chilena para o socialismo
e líamos talvez um livro acerca do programa da chamada unidade popular
e discursos de allende naquela cidade distante
embora houvesse muito mais notícias nos jornais
e a gente nos cafés falasse mais em futebol
livro por certo lido com a janela aberta sobre a noite do outono
sobre campos relvados de momento habitados pela escuridão
donde talvez se erguiam cantos pouco menos que religiosos
exaltadores de ideologias já e sem remédio ultrapassadas
Era uma vez um chileno chamado salvador allende que
fez um grande país de um país pequeno onde
talvez três anos nós houvéssemos depositado a esperança
quando fosse qual fosse a nossa nacionalidade
todos nós fomos um pouco chilenos
Mas que diabo importa em suma a qualquer de nós
que um homem se detenha quando a história caminha
em frente sempre altiva e serena
como mulher de muito tempo sabedora
Posso dizer por certo como há já muitos anos
acerca dos milicianos espanhóis dizia neruda
allende não morreste estás de pé no trigo
Ruy Belo

Saturday, September 07, 2024

Almoço com neto Branco



Almoço com o neto mais velho dos 3 mais novos. Chegados ao restaurante, 'ataca' as azeitonas, o queijo, o chouriço. Chega a lista. Lê tudo e diz-me 'quero costeletas de borrego'. Deito-lhe água no copo, continua a comer, desta vez melão e presunto. E pega no prato do paio. E no pão, onde põe manteiga. E mais azeitonas. E eu, deliciada a vê-lo comer com prazer. O pai diz-lhe que tem ainda as costeletas para comer, ao que ele responde 'eu sei'. E zás, pega na casca do melão e
'rapa' o que resta a dente. O dono do restaurante mete-se com ele e ri-se.
Chegam as costeletas, cinco, com arroz, batata frita e feijão verde. Serve-se de arroz e batatas para o prato, pega numa costela à unha e assim a come. Vai à segunda e à terceira, que come pegando no osso e rapando a carne toda. (Menino de Lisboa, adquiriu rapidamente hábitos de alentejano). Depois diz 'já não quero mais'...
Ainda comeu uma mousse de chocolate e, se eu tivesse insistido, talvez tivesse comido a segunda.
Adoro estas boquinhas abençoadas!
E não há poema melhor do que este neto. ❤

Friday, September 06, 2024

O monte e o rio


Na minha pátria tem um monte.
Na minha pátria tem um rio.
Vem comigo.
A noite sobe ao monte.
A fome desce ao rio.
Vem comigo.
E quem são os que sofrem?
Não sei, porém são meus.
Vem comigo.
Não sei, porém me chamam
e nem dizem: “Sofremos”
Vem comigo
E me dizem:
“Teu povo,
teu povo abandonado
entre o monte e o rio,
com dores e com fome,
não quer lutar sozinho,
te está esperando, amigo.”
Ó tu, a quem eu amo,
pequena, grão vermelho
de trigo,
a luta será dura,
a vida será dura,
mas tu virás comigo
Pablo Neruda

Saturday, August 31, 2024

Discurso de Aquilino Ribeiro

Uma imagem com Cara humana, retrato, esboço, quadro

Descrição gerada automaticamente

AQUILINO RIBEIRO

 

“Meus queridos camaradas, olhem sempre em frente, olhem para o sol, não tenham medo de errar sendo originais, iconoclastas, o mais anti que puderem, e verdadeiros, fugindo aos velhos caminhos trilhados de pé posto e a todas as conjuras dos velhos do restelo. Cultivem a inquietação como uma fonte de renovamento. E, enquanto vivermos, façamos de conta que trabalhamos para a eternidade e que tudo o que é produção do nosso espírito fica gravado em bronze para juízes implacáveis julgarem à sua hora”.

.  Uma imagem com escrita à mão, file, Tipo de letra, desenhos de criança

Descrição gerada automaticamente

— AQUILINO RIBEIRO (Sernancelhe, Viseu, 13 de Setembro de 1885 — Lisboa, 27 de Maio de 1963), escritor, no discurso que proferiu aquando da homenagem que lhe foi prestada pelos seus 50 anos de vida literária.

Sunday, August 25, 2024