Eu podia abrir um mapa: «o corpo» com relevos crepitantes
e depressões e veias hidrográficas e tudo o mais
morosas linhas e gravações um pouco obscuras
quando «ler» se fendia nalguma parte um buraco
que chegava repentinamente de dentro
a clareira arremessada pelo sono acima
insóna vulcânica sala contendo toda a febre «táctil»
furibunda maneira
esse era então uma espécie de «lugar interno»
áspera geologia alcalina e varrida e crua
exposta assim à leitura que se esqueceu do seu «medo»
o corpo com todas as «incursões» caligráficas
«referências» florais «desvios» ortográficos da família dos carnívoros
«antropofagias» gramaticais e «pegadas»
ainda ferventes
ou minas com o frio bater e o barulho escorrendo
«um mapa» onde se lia completamente o sangue e suas franjas
de ouro o irado desregramento da «traça
primeira» e o apuramento do mel com a labareda
inclusa o corpo na prancheta
para a lisura sentada onde se risca a posição mortal
«um papel» apenas a branca tensão do néon
no tecto o jorro de cima «declarando» qualquer rispidez
a suavidade toda uma bastarda
graça
de infiltração na sonolência ou explosiva
«vigilância» combustão das massas ao comprido
do «desenho» irregular
e só então assim desterrado do ruído nos subúrbios
ele apenas agora «composição» forte e atada de elementos
escarpas rapidamente
decorrendo
corpo que se faltava em tempo «fotografia»
de um «estudo» para sempre
como lhe bastava ser possível tão-só uma certa
temperatura
grutas aberturas minerais palpitações no subsolo
tremores
anfractuosidades esponjas onde pulsavam canais dolorosos
e a arfante matéria irrompendo nos écrans
com o susto leve das «manchas» que se uniam
essa energia sem espaço súbita «geometria» a costurar de fora
mordeduras velozes delicadezas
nervuras vivas
para seguir até ao fim «com os olhos»
como uma paisagem de espinhos faiscantes
«o contorno» que queima de uma lâmpada acesa
toda a noite no gabinete do cartógrafo.
Herberto Helder
(Antropofagias, Texto 4)
(continuo sem net. e sem o resto...)
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7 comments:
Profundo Maria, Profundo!
Obrigado pela lembrança do Yuri Gagarin
Beijo
João
Tens uma memória fascinante, lembras longe!
O resto... virá.
Espero que "a provncia" seja verde-esperança!
Bj
Tenho qualquer livro de Herberto Hélder, mas só há pouco tempo passei a ser mais frequente na poesia e não conhecia.
Adorei este mapa cartográfico, de uma geologia inebriante.
Beijos.
O homem é mesmo bom!
Abreijo.
Depois da relembrança do Gagarin... o Herberto Helder: nada mau...
Um beijo grande.
Não conhecia o poema e fiquei rendido e... pensativo.
Ai amiga, valha-te o Herberto Helder e o mar da nossa Foz:))))
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