Pachos na testa, terço na mão
Uma botija, chá de limão
Zaragatoas, vinho com mel
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher
Ai Lurdes, Lurdes, que vou morrer
Mede-me a febre, olha-me a goela
Cala os miúdos, fecha a janela
Não quero canja, nem a salada
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada
Se tu sonhasses, como me sinto
Já vejo a morte, nunca te minto
Já vejo o inferno, chamas diabos
Anjos estranhos, cornos e rabos
Vejo os demónios, nas suas danças
Tigres sem listras, bodes de tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes, que foi aquilo!
Não é a chuva, no meu postigo
Ai Lurdes, Lurdes, fica comigo
Não é o vento, a cirandar
Nem são as vozes, que vêm do mar
Não é o pingo de uma torneira
Põe-me a santinha, à cabeceira
Compõe-me a colcha, fala ao prior
Pousa o Jesus, no cobertor
Chama o doutor, passa a chamada
Ai Lurdes, Lurdes, nem dás por nada
Faz-me tisanas, e pão-de-ló
Não te levantes, que fico só
Aqui sozinho a apodrecer
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer.
(António Lobo Antunes)
12 comments:
Para um querido Amigos, com votos de rápidas melhoras...
Vá lá, é só uma infecção respiratória...
:)))))
É tão engraçado o poema e tão real...:-))
Abraço
Os homens e as suas pieguices...
:-)
Esta é uma das que nos demonstram o Lobo Antunes no seu melhor.
Excelente poema! Real!
bj,
Atchiiiim!
Abreijos.
Excelente partilha: obrigada.
Bom fds
Bshell
Os homens são mesmo uns lamechas quando estão doentes...
Maria, querida amiga, tem um bom domingo e uma boa semana.
Beijo.
É um encanto, esta lenga-lenga do ALA!! Tal qual a realidade:-))))))
Abracinhos sem febre!
Um texto que é um monumento à fragilidade (não apregoada) masculina!
;-)
Beijo
João
Que pena...
Eu que eu dava
para que tal poema
fosse... metáfora
Excelente sátira, não conhecia, obrigada pela partilha!
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