Wednesday, July 16, 2008

Um Poema

REZA, MARIA!

Suam no trabalho as curvadas bestas
e não são bestas
são homens, Maria!

Corre-se a pontapés os cães na fome dos ossos
e não são cães
são seres humanos, Maria!

Feras matam velhos, mulheres e crianças
e não são feras, são homens
e os velhos, as mulheres e as crianças
são os nossos pais
nossas irmãs e nossos filhos, Maria!

Crias morrem à míngua de pão
vermes nas ruas estendem a mão à caridade
e nem crias nem vermes são
mas aleijados meninos sem casa, Maria!

Bichos espreitam nas cercas de arame farpado
curvam cansados dorsos ao peso das cangas
e também não são bichos, Maria!

Do ódio e da guerra dos homens
das mães e das filhas violadas
das crianças mortas de anemia
e de todos que apodrecem nos calabouços
cresce no mundo o girassol da esperança.

Ah, Maria
põe as mãos e reza.
Pelos homens todos
e negros de toda a parte
põe as mãos
e reza, Maria!

José Craveirinha
(poema retirado do Cravo de Abril)

23 comments:

Anonymous said...

Sábio poema, no mesmo dia em que o governador do Banco de Portugal tarde e más horas "admite" a crise em Portugal.
O primeiro-ministro esse encolhe os ombros e empurra com a barriga.

Reza, Maria, porque serão uma vez mais os desgraçados a sofrer com a crise.

Um beijo que este ainda to posso dar!

Cristina Caetano said...

Os anos passam, os governos mudam, mas continuamos à mercê deles...

Beijinhos

pin gente said...

eu disse que vinha, e vim! e de onde vim só consigo ter paz. maria


um beijo
luísa

samuel said...

Avisaste que o trazias para aqui... e cumpriste. Em boa hora!
Quanto mais lido for, melhor!

Abreijo

Ana said...

Há vozes que são intemporais. Esta é uma delas. Pela força que denota, faz crescer o girassol da esperança.
Foi muito bom lê-la aqui. Obrigada, Maria.
Um beijo.

Leticia Gabian said...

"Do ódio e da guerra dos homens
das mães e das filhas violadas
das crianças mortas de anemia
e de todos que apodrecem nos calabouços
cresce no mundo o girassol da esperança."

Acredito no girassol.

Beijo de esperança

Carminda Pinho said...

É a hora Maria...
Põe as mãos e reza...eu rezo contigo.

Beijos

Fragmentos de Elliana Alves said...

que lindoooooo poema Maria,bjssssss de luz e paz minha querida,adorei teu blog,parabéns.

Fragmentos de Elliana Alves said...

que lindoooooo poema Maria,bjssssss de luz e paz minha querida,adorei teu blog,parabéns.

Parapeito said...

Falar em Craveirinha é não esquecer Moçambique...é lembrar quanta injustiça quanta brutalidade
quanta arrogância mastiga este mundo.
Gostei muito de o reler aqui...
E no céu dos poetas, decerto ele está a rezar por todos nós.

Sunshine said...

H� olhos que se fecham propositadamente para n�o verem esta falta de humanidade. H� quem tente desviar o olhar dos outros com manobras de divertimento s� para que n�o se apercebam deste mundo podre a que ironicamente chamam "aldeia global".
beijinhos

lisse said...

Boa escolha de palavras que eu não conhecia.
E tanta gente pensa que é um passado distante...

Era juso e urgente que eu dissesse que venho aqui. Também que foi muito gratificante encontrá-la num outro lugar de afectos raros (a quem eu sou infinitamente grata). Lá nos voltaremos a encontrar, porque eu desisto de tudo, menos das pessoas de quem gosto. Aqui também porque nunca mais passarei em silêncio total...

beijo e dia feliz

Carla said...

porque o mundo continua a ser palco de inúmeras injustiças...este poema continua muito actual
beijos

Licínia Quitério said...

Ah Maria, são tão urgentes as flores neste deserto!

Beijinh.

Anonymous said...

mais um que não conhecia...

Fernando Samuel said...

Pois claro, o prometido é devido - e está cumprido...
Um beijo amigo.

Teresa Durães said...

mais um lindo poema!

Unknown said...

Poema forte. Belo. É preciso lembrar. Rezar também. Mas lutar. E avisar a malta, como diria o Zeca.
Beijo, Maria.

Eduardo

Nilson Barcelli said...

Li alguns poemas do Craveirinha, salvo erro poeta moçambicano, que infelizmente já não é vivo. Todos os que li são excelentes e este não foge à regra.
Parabéns pela escolha e obrigado pela partilha, Maria...

Beijinhos.

mariam [Maria Martins] said...

não conhecia!
dramático... e infelizmente duma actualidade que assusta...

mas mesmo neste vale de aflições, não me parece que seja possível que os H/M deste país voltem a sentir o peso da "canga"... isso não!

um sorriso (algo triste) :(

mariam [Maria Martins] said...

não conhecia!
dramático... e infelizmente duma actualidade que assusta...

mas mesmo neste vale de aflições, não me parece que seja possível que os H/M deste país voltem a sentir o peso da "canga"... isso não!

um sorriso (algo triste) :(

Ana said...

Um beijinho, Maria.

BlueVelvet said...

Maria,
doeu ler este poema, mas imagino que fosse essa a tua intenção.
Beijinhos e veludinhos azuis