Thursday, April 09, 2015

Poema dedicado a Adriano Correia de Oliveira




MEU CAMARADA E AMIGO

Revejo tudo e redigo
meu camarada e amigo.
Meu irmão suando pão
sem casa mas com razão.
Revejo e redigo
meu camarada e amigo

As canções que trago prenhas
de ternura pelos outros
saem das minhas entranhas
como um rebanho de potros.
Tudo vai roendo a erva
daninha que me entrelaça:
canção não pode ser serva
homem não pode ser caça
e a poesia tem de ser
como um cavalo que passa.
É por dentro desta selva
desta raiva deste grito
desta toada que vem
dos pulmões do infinito
que em todos vejo ninguém
revejo tudo e redigo:
Meu camarada e amigo.
Sei bem as mós que moendo
pouco a pouco trituraram
os ossos que estão doendo
àqueles que não falaram.
Calculo até os moinhos
puxados a ódio e sal
que a par dos monstros marinhos
vão movendo Portugal
— mas um poeta só fala
por sofrimento total!
Por isso calo e sobejo
eu que só tenho o que fiz
dando tudo mas à toa:
Amigos no Alentejo
alguns que estão em Paris
muitos que são de Lisboa.
Aonde me não revejo
é que eu sofro o meu país.

Ary dos Santos

1 comment:

Elvira Carvalho said...

Um excelente poema que não conhecia apesar de Ary ser um dos meus poetas preferidos.
Um abraço