Monday, November 30, 2009

Porque é tempo de Ary dos Santos II

Cantiga de Amigo

Nem um poema nem um verso nem um canto
tudo raso de ausência tudo liso de espanto
e nem Camões Virgílio Shelley Dante
o meu amigo está longe
e a distância é bastante.

Nem um som nem um grito nem um ai
tudo calado todos sem mãe nem pai
Ah não Camões Virgílio Shelley Dante!
o meu amigo está longe
e a tristeza é bastante.

Nada a não ser este silêncio tenso
que faz do amor sozinho o amor imenso.
Calai Camões Virgílio Shelley Dante:
o meu amigo está longe
e a saudade é bastante!

Sunday, November 29, 2009

Alves Redol, 40 anos depois



«Do alto Ribatejo e da Beira Baixa
eles descem às lezírias pelas mondas
e ceifas
gaibéus lhes chamam.»

Alves Redol
(29.Dezembro.1911 - 29.Novembro.1969)

Saturday, November 28, 2009

Música para o fim-de-semana



La Quête

Rêver un impossible rêve
Porter le chagrin des départs
Brûler d'une possible fièvre
Partir où personne ne part

Aimer jusqu'à la déchirure
Aimer, même trop, même mal,
Tenter, sans force et sans armure,
D'atteindre l'inaccessible étoile

Telle est ma quête,
Suivre l'étoile
Peu m'importent mes chances
Peu m'importe le temps
Ou ma désespérance
Et puis lutter toujours
Sans questions ni repos
Se damner
Pour l'or d'un mot d'amour
Je ne sais si je serai ce héros
Mais mon cœur serait tranquille
Et les villes s'éclabousseraient de bleu
Parce qu'un malheureux

Brûle encore, bien qu'ayant tout brûlé
Brûle encore, même trop, même mal
Pour atteindre à s'en écarteler
Pour atteindre l'inaccessible étoile

Thursday, November 26, 2009

Porque gosto tanto...



Por este rio acima
Deixando para trás
A côncava funda
Da casa do fumo
Cheguei perto do sonho
Flutuando nas águas
Dos rios dos céus
Escorre o gengibre e o mel
Sedas porcelanas
Pimenta e canela
Recebendo ofertas
De músicas suaves
Em nossas orelhas
leve como o ar
A terra a navegar
Meu bem como eu vou
Por este rio acima

Por este rio acima
Os barcos vão pintados
De muitas pinturas
Descrevem varandas
E os cabelos de Inês
Desenham memórias
Ao longo da água
Bosques enfeitiçados
Soutos laranjeiras
Campinas de trigo
Amores repartidos
Afagam as dores
Quando são sentidos
Monstros adormecidos
Na esfera do fogo
Como nasce a paz
Por este rio acima

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
meu bem

Por este rio acima
isto que é de uns
Também é de outros
Não é mais nem menos
Nascidos foram todos
Do suor da fêmea
Do calor do macho
Aquilo que uns tratam
Não hão-de tratar
Outros de outra coisa
Pois o que vende o fresco
Não vende o salgado
Nem também o seco
Na terra em harmonia
Perfeita e suave
das margens do rio
Por este rio acima

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
meu bem

Por este rio acima
Deixando para trás
A côncava funda
Da casa do fumo
Cheguei perto do sonho
Flutuando nas águas
Dos rios dos céus
Escorre o gengibre e o mel
Sedas porcelanas
Pimenta e canela
Recebendo ofertas
De músicas suaves
Em nossas orelhas
leve como o ar
A terra a navegar
Meu bem como eu vou
Por este rio acima

(Fausto)

Wednesday, November 25, 2009

Porque é tempo de Ary dos Santos I

Desespero

Não eram meus os olhos que te olharam
Nem este corpo exausto que despi
Nem os lábios sedentos que poisaram
No mais secreto do que existe em ti.

Não eram meus os dedos que tocaram
Tua falsa beleza, em que não vi
Mais que os vícios que um dia me geraram
E me perseguem desde que nasci.

Não fui eu que te quis. E não sou eu
Que hoje te aspiro e embalo e gemo e canto,
Possesso desta raiva que me deu

A grande solidão que de ti espero.
A voz com que te chamo é o desencanto
E o espermen que te dou, o desespero.

Monday, November 23, 2009

Faltam-me as palavras

Faltam-me as palavras para te dizer o que sinto. Mas basta que me olhes e podes ler-me por dentro. Falta-me o teu corpo para que as minhas mãos te atravessem. Mas faço-me ponte e estarei em breve a teu lado. Falta-me a tua voz para me acordar cedinho ou para o beijo de boa noite. Mas invento-me a cada instante e estás sempre dentro de mim.
Dos rios que navegámos faço margens cheias de árvores e flores e montes cheios de pedras e urze. E desenho-te. Das estradas que percorremos fiz um caminho único, onde passo a passo chegarei ao fim. E sorris-me. Dos mares em que mergulhámos deixo que a natureza os transforme em mantos de mansidão ou de revolta. E amo-te.
Faltam-me as palavras. Faltam-me as mãos. Faltas-me tu. Falta-me tanto...

Saturday, November 21, 2009

Friday, November 20, 2009

Logo à noite vai ser assim...


Este seu olhar quando encontra o meu
Fala de umas coisas
Que eu não posso acreditar
Doce é sonhar e pensar que você
Gosta de mim como eu de você
Mas a ilusão quando se desfaz
dói no coração de quem sonhou, sonhou demais
ah! se eu pudesse entender
O que dizem os teus olhos

Thursday, November 19, 2009

Dourado


Inventas palavras e cores e gestos
como eu gosto,
e pinto na areia búzios de sons e maresia
com que brincas
em cada onda de espuma
que se espraia na maré
sempre nossa, de ir e vir.
Do teu olhar de sonhos e ternuras
retiro o mosto,
que depois de fermentado e apurado
te darei a beber
num fim de tarde
na foz do rio prateado
que desagua neste imenso mar dourado.

Monday, November 16, 2009

Porque me apetece Joaquim Pessoa


BASTAVA-NOS AMAR

Bastava-nos amar. E não bastava
o mar. E o corpo? O corpo que se enleia?
O vento como um barco: a navegar
pelo mar. Por um rio ou por uma veia.

Bastava-nos ficar. E não bastava
o mar a querer doer em cada ideia.
Já não bastava olhar. Urgente: amar.
E ficar. E fazermos uma teia.

Respirar. Respirar até que o mar
pudesse ser amor em maré cheia.
E bastava. Bastava respirar

a tua pele molhada de sereia.
Bastava sim, encher o peito de ar.
Fazer amor contigo sobre a areia.

Joaquim Pessoa

Saturday, November 14, 2009

Thursday, November 12, 2009

*

Todos nós precisamos de momentos sozinhos. Dou-te um tempo para estares com o teu abraço, depois volto. Porque volto sempre, sem brisa nem névoa. Volto talvez com o vento. Ou em cada maré. Na onda que rebenta. No ar que respiras. Na ausência que te possui. No rio que corre de ti. E estou, sempre. Firme rocha, cavalo em galope na lezíria imensa do teu olhar...

Tuesday, November 10, 2009

Escreve-me um poema


Escreve-me um poema. Um poema que fale de flores e de mar, de crianças e jardins, de rochas e de espuma, de canções e de rios. Solta as palavras que a tua voz não diz.
Escreve-as, na forma de um poema. Fala das aves e das montanhas, do silêncio e do azul do céu, das árvores e do grito, da água e da fonte. Mas solta as palavras que a tua voz não diz.
Escreve-me um poema. Fala-me do cheiro a terra molhada, do barulho da onda a rebentar, do choro de uma criança a nascer, da ternura do abraço, do olhar quente e doce, do beijo com sabor a mel e sal...
Solta as palavras que teimas calar e escreve-me um poema...

Monday, November 09, 2009

Para descontrair...

Diz um puto francês para um português:
- Eu como chocolate e tu comes broa!
Triste, o puto português contou à mãe o sucedido, que lhe disse para responder o seguinte: "- E eu tenho o PS no governo e tu não tens..."

No outro dia o puto francês volta a chatear o português:
- Eu como chocolate e tu comes broa!
E então o português respondeu:
- E eu tenho o PS no governo e tu não tens...

O puto francês, sem resposta, foi para casa e contou também à sua mãe o que o puto português lhe tinha respondido, e a mãe disse-lhe:
- Olha filho, diz-lhe que não tens, mas que também vais ter!!!

No dia seguinte o puto francês chega, triunfante, e insiste com o português:
- Eu como chocolate e tu comes broa!
E responde-lhe outra vez o puto português:
- E eu tenho o PS no governo e tu não tens...
Diz então o puto francês:
- Não tenho, mas também vou ter...
E responde o português:
- Então também vais passar a comer broa que te vais lixar...

Recebida por mail...
(de volta já daqui a pouco.

boa semana a todos)

Sunday, November 01, 2009

Porque me apetece Eugénio de Andrade (e este poema é tão belo!)


(foto de algasp)

Poema à Mãe



No mais fundo de ti,
eu sei que te traí, mãe.

Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos.

Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!

Olha - queres ouvir-me? -
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;

ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;

ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal...

Mas - tu sabes - a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.


Eugénio de Andrade

(obrigada Cravo de Abril.
depois volto. como as aves...)