Friday, August 30, 2019

Carta - Petição da URAP


Ex-Presos Políticos protestam contra a criação do Museu Salazar

Carta enviada ao Primeiro Ministro e ao Presidente da Assembleia da República a 12 de Agosto de 2019, e hoje divulgada à Comunicação Social, assinada por 204 ex-presos políticos.

Exmo. Senhor Primeiro-Ministro
Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República
Lisboa, 12 de Agosto de 2019

Os abaixo-assinados, ex-presos políticos, manifestam, em nome próprio e no da memória de milhares de vítimas do regime fascista – de que Salazar foi principal mentor e responsável – o mais veemente repúdio pelo anúncio da criação de um “Museu Salazar” feito pelo Presidente da Câmara de Santa Comba Dão e apelam ao Governo para que, em conformidade com o relatório aprovado por unanimidade, em Julho de 2008, pela Comissão de Assuntos Constitucionais da Assembleia da República e com normas da Constituição da República Portuguesa, intervenha para impedir a concretização desse projeto que, longe de visar esclarecer a população e sobretudo as jovens gerações sobre o que foi o regime fascista, se prefigura como um instrumento ao serviço do seu branqueamento e um centro de romagem para os saudosistas do regime derrubado com o 25 de Abril.
Quando em muitos países se assiste ao renascer de forças fascistas e fascizantes, o país precisa, não de instrumentos de propaganda do fascismo – que a Constituição da República expressamente proíbe – mas de meios de pedagogia democrática que não deixem esquecer o cortejo de crimes do fascismo salazarista e preserve a memória das suas vítimas.
Os abaixo-assinados apelam ainda a todos os democratas e amantes da liberdade que se manifestem contra a criação, nos termos em que tem vindo a ser anunciado, desse memorial ao ditador.

Adelino Pereira da Silva
Afonso Rodrigues
Aguinaldo Cabral
Aguinaldo Espada de Oliveira Santos
Aires de Aguiar Bustorff
Albertino Almeida
Alberto Borges
Alexandre Jorge Almeida
Alexandre José Pirata
Alfredo Caldeira
Alfredo Guaparrão
Alfredo de Matos
Alice Capela
Álvaro Monteiro
Álvaro Pato
Américo Joaquim Brás
Américo Leal
Ana Abel
António Almeida
António Antunes Canais
António Borges Coelho
António Caçola Alcântara
António Cerqueira
António Espirito Santo
António Gervásio
António Graça
António Inácio Baião
António José Baltazar Condeço
António Lenine Moiteiro
António Melo
António Pedro Braga
António Ramalho Alcântara
António Redol
António Rodrigues Canelas
António Rodrigues Correia
António Santos
António Santos Pereira
António Velhinho Ventura
Armando Cerqueira
Arménio Marques Gil
Armando de Lacerda
Artur Monteiro de Oliveira
Artur Pinto
Aurélio Pato
Aurora Rodrigues
Bárbara Judas
Camilo Mortágua
Carlos Brito
Carlos Campos Rodrigues Costa
Carlos Coutinho
Carlos Marum
Carlos Myre Dores
Carlos Oliveira Santos
Clemente Alves
Conceição Matos
Cristiano de Freitas
Daniel Cabrita
Danilo Matos
Diana Andringa
Domingos Abrantes
Domingos Lopes
Domingos Pinho
Duarte Nuno Clímaco Pinto
Eduardo Baptista
Eduardo Ferreira
Eduardo Meireles
Elídia Rosa Caeiro
Emília Brederode
Encarnação Raminho
Estevão A. P. Caeiro Oca
Eugénia Varela Gomes
Eugénio Ruivo
Feliciano David
Fernando Almeida Simões
Fernando Baeta Neves
Fernando Chambel
Fernando Correia
Fernando Cortez Pinto
Fernando Flávio Espada
Fernando Martins Adão
Fernando Miguel Bernardes
Fernando Rosas
Fernando Vicente
Filipe Augusto Neves do Carmo
Filipe Mendes Rosas
Firmino Martins
Francisco Braga
Francisco Bruto da Costa
Francisco Carrasco dos Santos
Francisco do Carmo Martins
Francisco Lobo
Francisco Melo
Francisco Nilha Jorge
Francisco Silva Alves
Graça Érica Rodrigues
Helena Cabeçadas
Helena Neves
Helena Pato
Herculano Neto Silva
Humberto Rui Moreira
Isabel do Carmo
Jaime Fernandes
Jaime Serra
João Augusto Aldeia
João Carrasco Caeiro
João Queirós
João Viegas
Joaquim Barata
Joaquim Henrique Rodrigues
Joaquim Jorge Araújo
Joaquim Judas
Joaquim Labaredas
Joaquim Monteiro Matias
Joaquim P. Pinto Isidro
Joaquim Santos
Jorge Carvalho
Jorge Querido
Jorge Neto Valente
Jorge Seabra
Jorge Silva Melo
Jorge Vasconcelos
José A . Guimarães Morais
José Carlos Almeida
José Eduardo Baião
José Eduardo Brissos
José Ernesto Cartaxo
José Guimarães Morais
José Jaime Fernandes
José Lamego
José Leitão
José Luís Machado Feronha
José Manuel Serra Picão de Abreu
José Marcelino
José Mário Branco
José Marques
José Oliveira
José Revés
José Ribeiro Sineiro
José Teodósio Cachochas
José Pedro Soares
Justino Pinto de Andrade
Laura Valente
Lígia Calapês
Luís Firmino
Luís Fonseca
Luís Moita
Luís Figueiredo
Luísa Oliveira
Manuel Candeias
Manuel Custódio Jesus
Manuel Ferreira Gonçalves
Manuel Henriques Estevão
Manuel José Brás
Manuel Pedro
Manuel Pedro Baião
Manuel Policarpo Guerreiro
Manuel Quinteiro Gomes
Manuel Ruivo
Manuel dos Santos Guerreiro
Manuela Bernardino
Maria da Conceição Moita
Maria Custódia Chibante
Maria Dulce Antunes
Maria Emilia Miranda de Sousa
Maria Fernanda Dâmaso Marques
Maria da Graça Marques Pinto
Maria Guilhermina Ferreira Galveias
Maria Helena Rocha Soares
Maria Hermínia de Sousa Santos
Maria Isabel Areosa Feio de Barros
Maria João Gerardo
Maria José Pinto Coelho da Silva
Maria João Lobo
Maria José Ribeiro
Maria Luíza Sarsfield Cabral
Maria de Lurdes Clarisse
Maria Lourença Cabecinha
Maria Margarida Barbosa de Carvalho Pino
Mário Abrantes
Mário Araújo
Mário de Carvalho
Mário Lino
Matilde Bento
Miguel Guimarães
Miriam Halpern Pereira
Modesto Navarro
Nozes Pires
Nuno Luís Silva
Nuno Pereira da Silva Miguel
Nuno Potes Duarte
Óscar Manuel Romualdo
Óscar Vieira
Osvaldo Osório
Paula Correia
Pedro Borges
Raúl Carvalho
Sara Amâncio
Saúl Nunes
Sérgio Ribeiro
Sérgio Valente
Teresa Dias Coelho
Teresa Tito de Morais
Úrsula da Conceição Farinha
Vasco Paiva
Violante Saramago Matos
Vítor Dias
Vítor Zacarias

Wednesday, August 28, 2019

O último abraço que me dás

Ali, na sala de quimioterapia, jamais escutei um gemido, jamais vi uma lágrima. Somente feições sérias, de uma seriedade que não topei em mais parte alguma, rostos com o mundo inteiro em cada prega, traços esculpidos a fogo na pele

Para Luís Costa
O lugar onde, até hoje, senti mais orgulho em ser pessoa foi o Serviço de Oncologia do Hospital de Santa Maria, onde a elegância dos doentes os transforma em reis. Numa das últimas vezes que lá fui encontrei um homem que conheço há muitos anos. Estava tão magro que demorei a perceber quem era. Disse-me
- Abrace-me porque é o último abraço que me dá
durante o abraço
- Tenho muita pena de não acabar a tese de doutoramento
e, ao afastarmo-nos, sorriu. Nunca vi um sorriso com tanta dor entre parêntesis, nunca imaginei que fosse tão bonito.
Com o meu corpo contra o dele veio-me à cabeça, instantâneo, o fragmento de um poema do meu amigo Alexandre O'Neill, que diz que apenas entre os homens, e por eles, vale a pena viver. E descobri-me cheio de respeito e amor. Um rapaz, de cerca de vinte anos, que fazia quimioterapia ao pé de mim, numa determinação tranquila:
- Estou aqui para lutar
e, por estranho que pareça, havia alegria em cada gesto seu. Achei nele o medo também, mais do que o medo, o terror e, ao mesmo tempo que o terror, a coragem e a esperança.
A extraordinária delicadeza e atenção dos médicos, dos enfermeiros, comoveu-me. Tropecei no desespero, no malestar físico, na presença da morte, na surpresa da dor, na horrível solidão da proximidade do fim, que se me afigura de uma injustiça intolerável. Não fomos feitos para isto, fomos feitos para a vida. O cabelo cresce-me de novo, acho-me, fisicamente, como antes, estou a acabar o livro e o meu pensamento desvia-se constantemente para a voz de um homem no meu ouvido
- Acabar a tese de doutoramento, acabar a tese de doutoramento, acabar a tese de doutoramento
porque não aceito a aceitação, porque não aceito a crueldade, porque não aceito que destruam companheiros. A rapariga com a peruca no braço da cadeira. O senhor que não olhava para ninguém, olhava para o vazio. Ali, na sala de quimioterapia, jamais escutei um gemido, jamais vi uma lágrima. Somente feições sérias, de uma seriedade que não topei em mais parte alguma, rostos com o mundo inteiro em cada prega, traços esculpidos a fogo na pele. Vi morrer gente quando era médico, vi morrer gente na guerra, e continuo sem compreender. Isso eu sei que não compreenderei. Que me espanta. Que me faz zangar. Abrace-me porque é o último abraço que me dá: é uma frase que se entenda, esta? Morreu há muito pouco tempo. Foda-se. Perdoem esta palavra mas é a única que me sai. Foda-se. Quando eu era pequeno ninguém morria. Porque carga de água se morre agora, pelo simples facto de eu ter crescido? Morra um homem fique fama, declaravam os contrabandistas da raia. Se tivermos sorte alguém se lembrará de nós com saudade. De mim ficarão os livros. E depois? Tolstoi, no seu diário: sou o melhor; e depois? E depois nada porque a fama é nada.
O que é muito mais do que nada são estas criaturas feridas, a recordação profundamente lancinante de uma peruca de mulher num braço de cadeira. Se eu estivesse ali sozinho, sem ninguém a ver-me, acariciava uma daquelas madeixas horas sem fim. No termo das sessões de quimioterapia as pessoas vão-se embora. Ao desaparecerem na porta penso: o que farão agora? E apetece-me ir com eles, impedir que lhes façam mal:
- Abrace-me porque talvez não seja o último abraço que me dá.
Ao M. foi. E pode afigurar-se estranho mas ainda o trago na pele. Durante quanto tempo vou ficar com ele tatuado? O lugar onde, até hoje, senti mais orgulho em ser pessoa foi o Serviço de Oncologia do Hospital de Santa Maria onde a dignidade dos escravos da doença os transforma em gigantes, onde só existem, nas palavras do Luís, Heróis.
Onde só existem Heróis. Não estou doente agora. Não sei se voltarei a estar. Se voltar a estar, embora não chegue aos calcanhares de herói algum, espero comportar-me como um homem. Oxalá o consiga. Como escreveu Torga o destino destina mas o resto é comigo. E é. Muito boa tarde a todos e as melhoras: é assim que se despedem no Serviço de Oncologia. Muito boa tarde a todos e até já, mesmo que seja o último abraço que damos.

Sunday, August 25, 2019

Nasceu-te um Filho


Nasceu-te um filho. Não conhecerás,
jamais, a extrema solidão da vida.
Se a não chegaste a conhecer, se a vida
ta não mostrou - já não conhecerás

a dor terrível de a saber escondida
até no puro amor. E esquecerás,
se alguma vez adivinhaste a paz
traiçoeira de estar só, a pressentida,

leve e distante imagem que ilumina
uma paisagem mais distante ainda.
Já nenhum astro te será fatal.

E quando a Sorte julgue que domina,
ou mesmo a Morte, se a alegria finda
- ri-te de ambas, que um filho é imortal.

Jorge de Sena, in 'Visão Perpétua'

Thursday, August 22, 2019

sem título



dói-me o pulmão esquerdo do planeta
e o amazonas.


o fascismo mata. mais que monóxido de carbono.

Miguel Tiago

Monday, August 19, 2019

Túmulo de Lorca


Em ti choramos os outros mortos todos
Os que foram fuzilados em vigílias sem data
Os que se perdem sem nome na sombra das cadeias
Tão ignorados que nem sequer podemos
Perguntar por eles imaginar seu rosto
Choramos sem consolação aqueles que sucumbem
Entre os cornos da raiva sob o peso da força

Não podemos aceitar. O teu sangue não seca
Não repousamos em paz na tua morte
A hora da tua morte continua próxima e veemente
E a terra onde abriram a tua sepultura
É semelhante à ferida que não fecha

O teu sangue não encontrou nem foz nem saída
De Norte a Sul de Leste a Oeste
Estamos vivendo afogados no teu sangue
A lisa cal de cada muro branco
Escreve que tu foste assassinado

Não podemos aceitar. O processo não cessa
Pois nem tu foste poupado à patada da besta
A noite não pode beber nossa tristeza
E por mais que te escondam não ficas sepultado

Sophia de Mello Breyner Andresen

Friday, August 16, 2019

Woodstock




Foram 3 dias de 'paz e música', que começaram a 15 de Agosto de 1969. Há 50 anos!
Jimi Hendrix, Janis Joplin, Carlos Santana, Joan Baez, The Who, Ravi Shankar, Joe Cocker, Credence Clearwater Revival, Joni Mitchel, Crosby, Stills, Nash & Young foram apenas alguns dos músicos que passaram pela fazenda da cidade de Bethel, interior de New York, de 15 a 18 de Agosto de 1969.
Foi há 50 anos, em Woodstock!


https://youtu.be/MwIymq0iTsw

Tuesday, August 06, 2019

Hiroshima




 6 de Agosto de 1945. 8h16, horário do Japão. O bombardeiro norte americano B-29 lança a “Little Boy” sobre Hiroshima, sede do comando militar do Japão Imperial. A explosão matou cerca de 100 mil pessoas. 35 mil ficaram feridas. Mais de 60 mil pessoas faleceram até ao final daquele ano, por causa dos efeitos da chuva radioactiva.
Repito, o bombardeiro norte americano B-29, que foi chamado de Enola Gay!