Thursday, September 11, 2025

Requiem por Salvador Allende


Foi de súbito no outono juro solenemente que o foi
mas as árvores fora tinham de novo folhas recentes
primavera no chile primavera no mundo
Sinto-me vivo habito muito de pé numa casa
leio vagarosamente os jornais sei devagar que os leio
enfrento meu velho borges o muito meu destino sul-americano
Acabara um poema enchia o peito de ar junto da água
sentia-me importante conquistara palavras negação do tempo
o mar era mais meu sob a minha voz ali solta na praia
talvez voz metafísica decerto voz de um privilegiado
ombro a ombro com gente analfabeta uma gente sensível e leal
mas que não pode ler e vive muito menos por o não saber
embora saiba olhar o mar sem o saber interpretar
acabara um poema enchia o peito de ar junto da água
quando o irmão miguei veio pequeninamente pela areia
e convulsivamente me falou da situação no chile
veio pela praia e punha nas palavras mãos de solidão
mãos conviventes com outras palavras mãos que palavra a palavra
erguem um poema no silêncio só circundante
Allende tinha uns óculos os óculos tinham-no
com eles via a vida com eles via os homens via homens
via problemas de homens e as coisas que via eram coisas de homens
hoje apenas uns óculos sem nenhum olhar por detrás
Nos finais de setembro nos princípios de novembro
tu meu amigo que não posso nomear sem te denunciar
dar-me-ás talvez notícias tuas notícias meramente pessoais
já que projectos sociais projectos cívicos profissionais
ficariam decerto nas policiais desertas mãos dos generais
mãos que mataram mãos que assaltaram a casa de neruda
mãos limpas já do sangue despojadas já das alianças
que caridosamente deram que assim conseguiram
solucionar os prementes problemas do país
Ouvi falar também desse cargueiro playa larga
praia comprida mas praia deserta e não só na palavra
pois quanta praia tinha hoje só tem o sangue dos milhares das pessoas fuziladas
A onze de setembro nesta praia portuguesa só uns passos pela areia
algum poema terminado alienado algum termo conquistado
tão inefável como por exemplo o de tancazo
atribuído ao golpe orientado por pablo rodriguez
homem que vai modelando palavras ao ritmo martelado pelo ódio
na tentativa vã de destruir frases hoje históricas
do grande cavalheiro que decerto foi allende
e já antes de o dizer com a vida dizia que por exemplo
mais vale morrer de pé do que viver ajoelhado ou então
se as direitas me ajudam a ganhar ganharão as direitas
País amável calorosa entrada em Santiago
e ver-me em frente desse homem sozinho relutante em recorrer às armas
e que depois de o ter visto e o ter ouvido
ao homem que for homem poderei chamar-lhe
seja qual for o nome salvador allende
Que nestas minhas minerais palavras de poeta
vibre um pouco o vigor da tua voz
bafejando de paz primeiro o bom povo do chile
depois o povo bom de todo o inundo
Que a ignomínia da história não demore em cobrir com o seu manto
os que têm a força mas não têm a razão
pois o nazi-fascismo não ganhou nem nunca ganhará
Mando-te uma ave preta rente à leve ondulação do mar
tu mandas-me no mar a ave branca do teu rosto
vento que vem do mar vento que vem do chile
Aqui neste dia de súbito cinzento
somente povoado pelo meu sofrimento
e pelo pensamento desse sofrimento
voo também vou também eu nesse lenço
que retiro do bolso aqui à beira-mar
e o meu lenço ao vento é uma ave avesíssima uma ave de paz
uma ave avezada a cada uma das derrotas existentes no mar
somente agora destruída trespassada pela bala que leva uma vida
ave que ao entoar seu canto profundíssimo afinal apenas diz
muito obrigada salvador allende
obrigada por essa tua vida de cabeça erguida
só agora tombada trespassada pela bala que leva uma vida
mas não pode levar de vencida a obra por allende começada
selada por essa promessa de lutar até ao fim até à hora de morrer
nesse importante posto onde te investiram a lei e o povo
Foi no ano de mil novecentos e setenta
ano em que eu fiquei a apodrecer no meu país
que uma coligação do tipo frente popular tomou
pela via legal conta do poder no chile
legalidade sempre respeitada por ti allende
mas por fim desrespeitada pelos militares pelas direitas pela
cristã democracia partido bem pouco cristão e pouco democrático
Falavas tu dizias a verdade
falavas com palavras de verdade
uma bala na boca nessa boca donde ainda pouco antes
saíam as palavras na verdade belas como balas
salvador allende guerrilheiro sem metralhadora e sem boina
de casaco e gravata para essas guerrilhas no parlamento
guerrilhas todas elas tão contrárias à guerra quão favoráveis à paz
essa palavra alada como ave ave não só de georges braque
mas de nós todos aves verticais aves a última estação
árvores desfolhadas num definitivo inverno
allende do cansaço dos problemas da preocupação constante em jogares limpo
com quem em vez de mãos utensílio de paz vinha com bombas em lugar das mãos
allende já há muito tempo sem uns olhos para olhares o mar
e sem poderes olhar as pedras preciosas de que fala
pablo neruda teu e meu poeta teu íntimo amigo
em las piedras dei cielo esse livro puríssimo
e são pedras do céu mas mais do que céu pedras da terra
Sol que te pões e nascerás no chile
leva-me a um país que em criança conhecíamos apenas
dos sacos de serapilheira com o nome impresso de um nitrato
e não por dar o nome a uma pequena mas confusa praça de lisboa
nem por sair nas páginas diárias dos jornais
Do chile chegou-me não há muito a amizade do hernán
que em madrid conheci e não responde há muito às minhas cartas
e a de mais chilenos de olhos vagamente tristes sérios quase portugueses
e desse país mais comprido do globo veio-me também
o lápis-lazúli pedra não já de esperança pedra de amizade
Os camiões há muito já que não sulcavam as estradas do país
estradas bafejadas pela aragem enviada pelo mar por esse
oceano pacífico de um país ainda há pouco bem pacífico
O washington post falava já do golpe dias antes do golpe
ninguém falava delas mas elas encontravam-se ali mesmo
as autoridades militares as autoridades militares as autoridades americanas
vestiam mesmo as fardas do exército chileno
esses americanos gente do dinheiro e do veneno
de um veneno talvez chamado dinheiro
que terá pago em parte as modificações dos foguetes do tipo poseidon
montados já a bordo dos divinos submarinos nucleares americanos
assunto de política estrangeira americana
Hernán urrutia meu amigo austral
que em barajas vi olhar voltar
para mim a cabeça pela última vez
marcelo coddo professor em concepción
com quem que bem me lembro conversei sobre o poeta cardenal
e sobre a jovem poesia nicaraguense
e tantos outros que nem mesmo me terão deixado o nome
mas me deixaram alguma palavra a música da fala um certo sorriso
um certo olhar visível por detrás de uns óculos
talvez hoje quebrados por quem não considera
talvez suficiente o quebrar da vida na haste da vida
embora porventura tenha visto aquela sequência de fellini
e desconhece que afinal a vida reproduz a arte
Escreve este poema no jornal com as notícias frescas
após ter evitado ver as caras de triunfo desses locutores luzidios da televisão
e mesmo ter ouvido até a voz desse pedro moutinho
a voz das afluências ao nosso principal estádio o da cova da iria
e dos cortejos presidenciais o dessas tão espontâneas manifestações
voz afinal da cia e da itt e dos demais tentáculos
do imperialismo norte-americano
maneira americana de se estar no mundo
de estar no mundo arrebatando o pão dos homens do terceiro mundo
terceiro mundo ou melhor último mundo
que pagarão agora o preço da cabeça dos trabalhadores chilenos
que marcham mas decerto em vão na direcção
do centro de santiago onde vingara
a rebelião dos marinheiros vindos de valparaiso
cabeça dos imensos deserdados deste mundo
Sabíamos decerto um pouco em que consistia
essa via chilena para o socialismo
e líamos talvez um livro acerca do programa da chamada unidade popular
e discursos de allende naquela cidade distante
embora houvesse muito mais notícias nos jornais
e a gente nos cafés falasse mais em futebol
livro por certo lido com a janela aberta sobre a noite do outono
sobre campos relvados de momento habitados pela escuridão
donde talvez se erguiam cantos pouco menos que religiosos
exaltadores de ideologias já e sem remédio ultrapassadas
Era uma vez um chileno chamado salvador allende que
fez um grande país de um país pequeno onde
talvez três anos nós houvéssemos depositado a esperança
quando fosse qual fosse a nossa nacionalidade
todos nós fomos um pouco chilenos
Mas que diabo importa em suma a qualquer de nós
que um homem se detenha quando a história caminha
em frente sempre altiva e serena
como mulher de muito tempo sabedora
Posso dizer por certo como há já muitos anos
acerca dos milicianos espanhóis dizia neruda
allende não morreste estás de pé no trigo
Ruy Belo


Saturday, August 30, 2025

Da Condição Humana

 
Todos sofremos.
O mesmo ferro oculto
Nos rasga e nos estilhaça a carne exposta
O mesmo sal nos queima os olhos vivos.
Em todos dorme
A humanidade que nos foi imposta.
Onde nos encontramos, divergimos.
É por sermos iguais que nos esquecemos
Que foi do mesmo sangue,
Que foi do mesmo ventre que surgimos.
Ary dos Santos

Monday, August 25, 2025

Pequeno Poema


Quando eu nasci,
ficou tudo como estava.
Nem homens cortaram veias,
nem o Sol escureceu,
nem houve Estrelas a mais...
Somente,
esquecida das dores,
a minha Mãe sorriu e agradeceu.
Quando eu nasci,
não houve nada de novo
senão eu.
As nuvens não se espantaram,
não enlouqueceu ninguém...
P'ra que o dia fosse enorme,
bastava
toda a ternura que olhava
nos olhos de minha Mãe...
Sebastião da Gama

Friday, August 22, 2025

Os Estivadores


Só eles suam mas só eles sabem
o preço de estar vivo sobre a terra
nessas mãos enormes é que cabem
as coisas mais reais que a vida encerra.
Outros rirão e outros sonharão
podem outros roubar-lhes a alegria
mas a um deles é que chamo irmão
na vida que em seus gestos principia.
Onde outrora houve o deus e houve a ninfa
eles são a moderna divindade
e o que antes era pura linfa
é o que sobra agora da cidade.
Vede como alheios a tudo o resto
compram com o suor a claridade
e rasgam com a decisão do gesto
o muro oposto pela gravidade.
Ode marítima é que chamo à ode
escrita ali sobre a pedra do cais
A natureza é certo muito pode
mas um homem de pé pode bem mais.

Ruy Belo

Thursday, August 21, 2025

Um Adeus Português


Nos teus olhos altamente perigosos
vigora ainda o mais rigoroso amor
a luz dos ombros pura e a sombra
duma angústia já purificada

Não tu não podias ficar presa comigo
à roda em que apodreço
apodrecemos
a esta pata ensanguentada que vacila
quase medita
e avança mugindo pelo túnel
de uma velha dor

Não podias ficar nesta cadeira
onde passo o dia burocrático
o dia-a-dia da miséria
que sobe aos olhos vem às mãos
aos sorrisos ao amor mal soletrado
à estupidez ao desespero sem boca
ao medo perfilado
à alegria sonâmbula à vírgula maníaca
do modo funcionário de viver

Não podias ficar nesta casa comigo
em trânsito mortal até ao dia sórdido
canino
policial
até ao dia que não vem da promessa
puríssima da madrugada
mas da miséria de uma noite gerada
por um dia igual

Não podias ficar presa comigo
à pequena dor que cada um de nós
traz docemente pela mão
a esta pequena dor à portuguesa
tão mansa quase vegetal

Não tu não mereces esta cidade não mereces
esta roda de náusea em que giramos
até à idiotia
esta pequena morte
e o seu minucioso e porco ritual
esta nossa razão absurda de ser

Não tu és da cidade aventureira
da cidade onde o amor encontra as suas ruas
e o cemitério ardente
da sua morte
tu és da cidade onde vives por um fio
e puro acaso
onde morres ou vives não de asfixia
mas às mãos de uma aventura de um comércio puro
sem a moeda falsa do bem e do mal

Nesta curva tão terna e lancinante
que vai ser que já é o teu desaparecimento
digo-te adeus
e como um adolescente
tropeço de ternura
por ti

Alexandre O'Neill

Monday, August 18, 2025

POEMA DAS ÁRVORES

 
As árvores crescem sós. E a sós florescem.
Começam por ser nada. Pouco a pouco
se levantam do chão, se alteiam palmo a palmo.
Crescendo deitam ramos, e os ramos outros ramos,
e deles nascem folhas, e as folhas multiplicam-se.
Depois por entre as folhas, vão-se esboçando as flores,
e então crescem as flores, e as flores produzem frutos,
e os frutos dão sementes,
e as sementes preparam novas árvores.
E tudo sempre a sós, a sós consigo mesmas.
Sem verem, sem ouvirem, sem falarem.
Sós.
De dia e de noite.
Sempre sós.
Os animais são outra coisa.
Contactam-se, penetram-se, trespassam-se,
fazem amor e ódio, e vão à vida
como se nada fosse.
As árvores, não.
Solitárias, as árvores,
exauram terra e sol silenciosamente.
Não pensam, não suspiram, não se queixam.
Estendem os braços como se implorassem;
com o vento soltam ais como se suspirassem;
e gemem, mas a queixa não é sua.
Sós, sempre sós.
Nas planícies, nos montes, nas florestas,
a crescer e a florir sem consciência.
Virtude vegetal viver a sós
e entretanto dar flores.
António Gedeão, in 'Obra Poética'

Friday, August 15, 2025

SONETO DA ROSA

 
Mais um ano na estrada percorrida
Vem, como o astro matinal, que a adora
Molhar de puras lágrimas de aurora
A morna rosa escura e apetecida.
E da fragrante tepidez sonora
No recesso, como ávida ferida
Guardar o plasma múltiplo da vida
Que a faz materna e plácida, e agora
Rosa geral de sonho e plenitude
Transforma em novas rosas de beleza
Em novas rosas de carnal virtude
Para que o sonho viva da certeza
Para que o tempo da paixão não mude
Para que se una o verbo à natureza.
Vinícius de Moraes

Wednesday, August 13, 2025

A Fidel Castro

 
Fidel, Fidel, los pueblos te agradecen
palabras en acción y hechos que cantan,
por eso desde lejos te he traído
una copa del vino de mi patria:
es la sangre de un pueblo subterráneo
que llega de la sombra a tu garganta,
son mineros que viven hace siglos
sacando fuego de la tierra helada.
Van debajo del mar por los carbones
Y cuando vuelven son como fantasmas:
se acostumbraron a la noche eterna,
les robaron la luz de la jornada
y sin embargo aquí tienes la copa
de tantos sufrimientos y distancias:
la alegría del hombre encarcelado,
poblado por tinieblas y esperanzas
que adentro de la mina sabe cuándo
llegó la primavera y su fragancia
porque sabe que el hombre está luchando
hasta alcanzar la claridad más ancha.
Y a Cuba ven los mineros australes,
los hijos solitarios de la pampa,
los pastores del frío en Patagonia,
los padres del estaño y de la plata,
los que casándose con la cordillera
sacan el cobre de Chuquicamata,
los hombres de autobuses escondidos
en poblaciones puras de nostalgia,
las mujeres de campos y talleres,
los niños que lloraron sus infancias:
ésta es la copa, tómala, Fidel.
Está llena de tantas esperanzas
que al beberla sabrás que tu victoria
es como el viejo vino de mi patria:
no lo hace un hombre sino muchos hombres
y no una uva sino muchas plantas:
no es una gota sino muchos ríos:
no un capitán sino muchas batallas.
Y están contigo porque representas
todo el honor de nuestra lucha larga
y si cayera Cuba caeríamos,
y vendríamos para levantarla,
y si florece con todas sus flores
florecerá con nuestra propia savia.
Y si se atreven a tocar la frente
de Cuba por tus manos libertada
encontrarán los puños de los pueblos,
sacaremos las armas enterradas:
la sangre y el orgullo acudirán
a defender a Cuba bienamada.
Pablo Neruda
Canción de gesta, 1960



Tuesday, August 05, 2025

Hoje assinei pela Paz

 
Sob as altas árvores da Alameda
e uma jovem com olhos de esperança.
Junto com ela, outras jovens pediram mais assinaturas
e aquela hora foi como uma pátria iluminada
do amor ao amor, da graça pela graça,
de uma luz para outra luz.
Hoje assinei pela Paz.
E comigo, em cem países, cem milhões de assinaturas,
cem orquestras do mundo, uma sinfonia universal,
uma única canção pela Paz no mundo.
Hoje não assinei o poema nem os pequenos artigos,
nem o documento que te escraviza,
Eu não assinei a carta que não sente
nem a mensagem que durará um segundo.
Hoje assinei pela Paz.
Para que o tempo não pare,
para que o sonho não imobilize,
para que o sorriso seja alto e claro,
para que uma mulher aprenda a ver seu filho crescer
e os alunos do filho veem como sua mãe fica cada dia mais jovem.
Hoje dei uma assinatura, a minha, pela Paz.
Um mar de assinaturas que afogam e atordoam
ao industrial e ao político da guerra.
Uma onda gigantesca de assinaturas gigantescas:
o tremor da criança que mal balbucia a palavra,
que é uma rosa das lágrimas da mãe,
a assinatura da humildade – a assinatura do poeta.
Hoje aumentei em um o número mundial de assinaturas pela Paz.
E estou feliz como um adolescente apaixonado,
como uma árvore em pé,
como a primavera inesgotável
e como o rio com seu canto de cristais soberbos.
Hoje parece que não fiz nada
e ainda assim, dei a minha assinatura pela Paz.
A jovem sorriu para mim e em seus lábios havia uma pomba viva,
e ela agradeceu-me com seus olhos de esperança
e continuei meu caminho em busca de um livro para meus filhos.
Bem, lá estava a minha assinatura, precisa e clara,
ao pé do Apelo de Berlim.
Parece que não fiz nada
e ainda assim, acredito que multipliquei minha vida
e multiplicou os desejos mais saudáveis.
Hoje assinei pela Paz.
Efraín Huerta

Thursday, April 17, 2025

Hás de morrer de não me ver

 
Hás de morrer no meu olhar,
quando eu fechar os olhos cansados
de reter os meus versos,
em busca de outros versos diferentes,
igualmente diferentes,
ainda teus,
tão teus,
tão profundamente teus
que os amo
antes de os escrever,
antes até pensar que me era possível
escrevê-los.
Hei de morrer de não te ver.
Apunhalado por um vazio perfeito,
o mais significativo vazio,
representado na grande antologia dos vazios.
Morremos ambos de lonjura
e solidão.
Ceguinhos um do outro.
Habituados
à luz escura desta
ideia.

Joaquim Pessoa
(o Poeta com olhos de pássaro.
E todos os pássaros se calaram muito antes de anoitecer.)

Thursday, April 03, 2025

Salgueiro Maia

 

Aquele que na hora da vitória
Respeitou o vencido
Aquele que deu tudo e não pediu paga
Aquele que na hora da ganância
Perdeu o apetite
Aquele que amou os outros e por isso
Não colaborou com sua ignorância ou vício
Aquele que foi «Fiel à palavra dada à ideia tida»
Como antes dele mas também por ele
Pessoa disse
Sophia de Mello Breyner Andresen
(Salgueiro Maia deixou-nos no dia de hoje, em 1992

Saturday, March 29, 2025

I Encontro da Canção Portuguesa

 
No dia de hoje, há 51 anos, houve um concerto muito especial no Coliseu. Nessa noite respirou-se melhor!
Foi o I Encontro da Canção Portuguesa, que contou, entre outros, com José Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Fausto, Manuel Freire, José Jorge Letria, Carlos Paredes, Vitorino, José Barata-Moura, Carlos Moniz, Maria do Amparo, Fernando Tordo, Ary dos Santos, sendo que outros foram impedidos de atuar.


"A última grande manifestação cultural de massas do tempo da ditadura aconteceu em Lisboa, a 29 de Março de 1974. Na véspera, Marcello Caetano dirigira aos telespectadores mais uma (a última) das suas «Conversas em Família» [1]. À noite, o Coliseu dos Recreios abriu as portas para o primeiro e o mais histórico dos encontros ao vivo da música portuguesa. Organizado pela Casa da Imprensa, marcou de forma inequívoca o fim próximo do regime. José Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Manuel Freire, Fausto, José Jorge Letria, Carlos Paredes, Fernando Tordo, José Barata-Moura, Ary dos Santos e Vitorino são os nomes principais da ”festa”, autorizada depois de algumas diligências nada fáceis por parte da Casa da Imprensa.
Com a lotação esgotada desde muitos dias antes, o Coliseu transforma-se num imenso coro de cinco mil vozes dispostas a cantar bem alto o outro lado da realidade permitida. Há agentes da PIDE por todo o lado, ninguém o ignora. O espectáculo tarda a começar porque Adriano não tinha enviado os textos ao “exame prévio” da Censura. A situação acabará por resolver-se graças a dois censores “casualmente” de serviço na plateia do Coliseu que, ali mesmo, decidem quais os temas que podem ou não ser ouvidos.
Quando finalmente tem início o “desfile”, é a apoteose. Primeiro com alguns equívocos, como aconteceu durante a primeira parte da actuação de José Carlos Ary dos Santos, recebida com uma chuvada de apupos por parte do público. Mas a força da sua poesia impôs-se e quando debitou «SARL, SARL, a pança do patrão não lhe cabe na pele» já ninguém tinha dúvidas de que aquele homem era efectivamente dos nossos...
Depois, foi o grande coro colectivo, a culminar com os cinco mil espectadores, de pé, a entoar os versos de «Grândola, Vila Morena», ironicamente a única canção de Zeca a passar integralmente as malhas da Censura. E é o seu grande impacto na noite de 29 de Março que irá determinar a sua escolha para senha do Movimento das Forças Armadas, na noite de 24 para 25 de Abril.
______________________
[1] «Conversas em Família» era a designação das intervenções televisivas que Marcello Caetano efectuava regularmente. Tratava-se de discursos previamente escritos, mas lidos como se fossem improvisos. Para esse efeito, a RTP comprou o seu primeiro teleponto.
______________________
Viriato Teles, As Voltas de um Andarilho – Fragmentos da vida e obra de José Afonso, 2.ª edição, Lisboa, Assírio & Alvim, 2009, pp.134-135."


Wednesday, March 26, 2025

Natureza

 

Uma folha com uma gota de água. Doze formigas a matarem a sede.
O que surpreende é que as formigas se dividiram em 4 grupos de 3, para equilibrarem a folha por forma a que a gota de água não caia.
As pequenas maravilhas da Natureza não deixam de surpreender. Este é o tipo de coordenação que precisamos entre as pessoas para avançarmos como Sociedade.

Monday, March 24, 2025

Concerto "O Povo e uma Guitarra" - Centenário de Carlos Paredes


Fórum Lisboa cheio para homenagear Carlos Paredes no ano em que se comemora o seu centenário. 🎵🎶Honrar a memória de Carlos Paredes é promover a sua genial e extraordinária obra, a sua vida de homem, de músico, de militante comunista, um símbolo ímpar da Cultura e da música portuguesa. O ponto alto das comemorações do PCP, o Concerto "O Povo e uma Guitarra" contou com a participação de vários artistas e músicos de renome que trouxeram ao Fórum Lisboa a sua criatividade, o seu trabalho e a sua arte.

Monday, March 17, 2025

Tomada de posse do Conselho da Revolução

 
Há 50 anos, a 17 de março de 1975, tomava posse o Conselho da Revolução, um órgão que centralizava competências políticas e militares e respondia à questão da institucionalização do Movimento das Forças Armadas (MFA).

A partir desta data, o Conselho da Revolução passa a reunir competências que anteriormente pertenciam à Junta de Salvação Nacional, ao Conselho de Estado e ao Conselho dos Chefes dos Estados-Maiores (governo das Forças Armadas). Tornava-se assim um órgão de topo da estrutura político-militar que reunia funções tão diversas como o governo das Forças Armadas, a fiscalização da atividade do governo e o acompanhamento da conformidade da atividade governativa com o Programa do MFA.

Para além do Conselho da Revolução, a institucionalização do MFA compreende também a formalização da Assembleia do MFA, um órgão colegial de representação do Movimento, tendo em vista o acompanhamento da situação político-militar do país.

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