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Friday, December 06, 2024

Voto de pesar pela morte de Celeste dos Cravos aprovado por unanimidade

Apresentada pelo PCP, a iniciativa recordou a mulher que um dia «levantou-se para ir trabalhar num restaurante situado em Lisboa, na Rua Braancamp» e acabou por dar cor à Revolução. Após a votação todos, à excepção do Chega e CDS, bateram palmas de pé.


Celeste Caeiro, também conhecida carinhosamente por Celeste dos Cravos, faleceu no passado dia 15 de Novembro, aos 91 anos. Nascida em Lisboa a 2 de Maio de 1933, «oriunda de uma família humilde, e viveu grande parte da sua vida em Lisboa», Celeste ficou na história por ter sido a pessoa que começou a distribuir cravos, batizando a Revolução e tornando-se numa cara de Abril.

«Enfrentou uma vida de dificuldades com perseverança. Mulher trabalhadora, de fortes convicções, e militante comunista até ao fim da sua vida, a sua generosidade e afabilidade ficará na memória de todos os que com ela conviveram», podia ler-se na iniciativa apresentada pelo PCP. 

O voto de pesar dos comunistas descreveu também o dia em que Celeste ficou na história, relembrando que o restaurante onde trabalhava fazia um ano a 25 de Abril de 1974 e por essa razão comprou flores para oferecer aos clientes. Com o alvoroço e incerteza, o restaurante acabou por não abrir nesse dia e os cravos foram distribuídos pelas trabalhadoras. Celeste não foi para casa, juntou-se aos populares no Chiado e tendo sido informada por um dos soldados de que estava em curso uma revolução, ofereceu-lhe um cravo que o militar colocou no cano da espingarda. 

Aprovado por unanimidade, de seguida as bancadas bateram palmas de pé aos familiares presentes nas galerias, à exceção do Chega e CDS-PP, cujos deputados permaneceram sentados. 

Friday, November 15, 2024

Celeste dos cravos

Faleceu a Celeste, que distribuiu os cravos que acabaram no cano das espingardas

Celeste Caeiro, que fez dos Cravos sinónimo de Abril, faleceu hoje, aos 91 anos. Mulher trabalhadora e militante comunista, teve uma vida marcada pelo seu compromisso com os valores de Abril.


A Celeste dos Cravos, apesar da idade avançada, não recusava solicitações para partilhar a sua história, para participar em comemorações da Revolução de Abril. Foi assim até este ano, quando se celebram os 50 anos de Abril: esteve no mar de gente que desceu a Avenida da Liberdade, na sua cidade de Lisboa, mas também fez questão de estar na Festa do «Avante!», a realização anual do seu partido, o PCP.
Celeste Caeiro nasceu em Lisboa, em Maio de 1933, cidade onde trabalhou viveu grande parte da sua vida. De origens humildes, na manhã de 25 de Abril de 1974, com 40 anos, saiu de casa no Chiado, onde vivia, com a sua mãe e a filha ao seu cuidado, rumo ao restaurante onde trabalhava, no edifício Franjinhas, na Rua Braancamp. Nas palavras de Celeste, «a casa fazia um ano nesse dia, os patrões queriam fazer uma festa e o gerente comprou flores». Com as operações dos capitães de Abril em curso ali ao lado, o restaurante não chegou a abrir e Celeste levou os cravos no caminho de volta a casa.
Foi já no Chiado que se deparou com os veículos militares que rumavam ao Quartel do Carmo, para deter Marcelo Caetano. Foi isso que lhe explicou o jovem militar (que, para seu desgosto, Celeste nunca voltou a encontrar) a quem perguntou o que se passava. «Isto é uma Revolução!», acrescentou, no relato da própria Celeste, a que se seguiu o pedido de um cigarro. Celeste não fumava, a tabacaria estava fechada, mas a sua gratidão para com aqueles jovens que protagonizavam a libertação de 48 anos de fascismo levou a oferecer-lhes o que tinha: os cravos vermelhos que acabaram nos canos das espingardas. Com o seu gesto carregado de simbolismo, Celeste Caeiro deu expressão à adesão popular às acções do Movimento das Forças Armadas, naquele mesmo dia, e que viria a ser sintetizado na fórmula «Aliança Povo-MFA».
«Correu tudo muito bem. Tinha de correr, pois os cravos estavam nas espingardas e elas assim não podiam disparar...», contou sobre o dia em que o País se libertou da ditadura fascista. Celeste Caeiro faleceu hoje, aos 91 anos.
 
AbrilAbril

Tuesday, April 23, 2024

CELESTE CAEIRO



"O soldado pediu-me um cigarro. Eu não fumava, nunca fumei. Por segundos, fiquei a pensar como poderia compensar aquele rapaz, ali, em cima daquele carro, a lutar por nós. Estava ali a dar-me uma coisa boa e eu sem nada para lhe dar. Sem pensar, tirei um cravo do ramo que levava e ofereci-lho.
Nunca me passou pela cabeça que por causa disso o 25 de Abril viesse a ser conhecido mundialmente como a Revolução dos Cravos.
Nunca se conseguiu encontrar aquele rapaz. Sempre que penso naquele dia choro. Tinha 40 anos, cuidava da minha mãe e da minha filha. Morava no Chiado e adorava a cidade onde nasci. E ainda adoro.
Tenho 90 anos, ouço e vejo muito mal. Comovo-me muito a falar deste dia. Os médicos dizem que me faz mal. Vou pedir à minha neta que lhe conte o resto da história. Viva o 25 de Abril! Se o deixarmos morrer teremos de fazer outro."

CAROLINA
Carolina 23 anos. É mestre em Direito. Quer ser magistrada. Vive em Alcobaça.
"Havia sempre nos livros da escola a referência à Revolução dos Cravos. A cada ano, mal recebia os manuais, ia de imediato à procura dessas páginas. Sabia que as professoras, nem que fosse uma vez por ano, haveriam de falar no assunto e que eu, mais uma vez, ficaria em silêncio. Nunca disse na escola que foi a minha avó que deu o nome à revolução. Apesar de todo o orgulho que tenho. Acredito mesmo que aquele gesto foi obra do destino.
A minha avó Celeste é filha de uma espanhola de Badajoz e de pai desconhecido. Com dois irmãos, mais velhos, cresceu na Casa Pia. À minha bisavó custou-lhe até muito deixar ali os filhos, que visitava regularmente. Nunca os abandonou.
A minha avó era a menina favorita da diretora do colégio. Fez o Curso de Enfermagem, mas como tinha problemas pulmonares não pode exercer. Porém, a menina Celeste foi sempre independente. Nunca se casou com o meu avô. Quando o meu avô se portou mal, tinha a minha mãe 3 anos, separaram-se. Para consolar a minha avó, quis oferecer-lhe um fio de ouro e mais coisas. Mas a minha avó não quis saber dos presentes, nem dele. Sozinha, continuou a cuidar da filha e da mãe.
Em abril de 1974, trabalhava num restaurante. O restaurante fazia um ano no dia 25 de abril. Os cravos eram para dar aos clientes. Com o restaurante fechado, as empregadas ficaram com as flores.
Dá-se então o feliz episódio, no início da Rua do Carmo. Um fotógrafo (Carlos Gil) assistiu à cena. Publicou a fotografia. No dia seguinte a minha avó foi trabalhar. Já os colegas tinham ligado para a Crónica Feminina, que logo a foi entrevistar.
Este ano, esse episódio será reconstituído. A minha avó gostava muito que uma placa assinalasse o local. Algo a dizer que foi ali que nasceu o nome Revolução dos Cravos. Ou até ter ali uma pequena estátua.
Falar do 25 de Abril emociona-a muito. Nestes períodos, fica melancólica. Acreditamos que o AVC que sofreu pouco depois das comemorações dos 25 anos de Abril terá tido a ver com as emoções que sentiu. No entanto, tem sido muito ignorada por todos.
Não há fotografias da minha avó com 40 anos. No incêndio do Chiado, perdeu a casa e todos os pertences. As fotografias arderam. Foram-se todas as recordações. Vive há anos num prédio a cair aos bocados, perto da Avenida da Liberdade. Podia viver com a filha e a neta em Alcobaça. Mas à minha avó, alfacinha de gema, ninguém a consegue tirar de Lisboa.
A minha avó, que continua a prestar muita atenção às notícias, está muito preocupada com o país. Na noite das últimas eleições, ao contrário do que é hábito, foi deitar-se cedo. “Não estou para ver esta miséria.” A mim ensinou-me desde miúda que o valor mais importante é o da liberdade."
Depoimento recolhido por Alexandra Tavares-Teles, Diário de Notícias, 23/04/2024